Artigo publicado online no periódico www.sciencemag.org.
GIBBONS Ann. Did Europeans Get Fat From Neandertals?, 2014. Disponível em:< http://www.sciencemag.org/news/2014/04/did-europeans-get-fat-neandertals/>. Acesso em: 10 de setembro de 2016.
Palavras chaves: Arqueologia, Evolução, Paleontologia e Biologia.
Neanderthais e europeus modernos apresentavam algo em comum: ambos eram fatheads? de mesma laia (ilk). Uma nova análise genética revela que nossos primos musculosos tinham um número de genes distintos envolvidos no estabelecimento de certos tipos de gordura em seus cérebros e outros tecidos - uma peculiaridade compartilhada pelos europeus contemporâneos, mas não pelos asiáticos. Porque dois-terços de nossos cérebros são construídos por ácidos graxos, ou lipídios, as diferenças na composição de gordura entre europeus e asiáticos pode ter consequências funcionais, talvez em ajudar aos europeus a se adaptarem a climas mais frios ou causando doenças metabólicas.
"Esta é a primeira vez que nós temos visto diferenças em concentrações de lipídio entre populações," diz o biólogo evolucionário Philipp Khaivatovitch, do CAS-MPG Partner Institute for Computational Biology in Shangay, China, e Max Planck Institute for Evolutionary Anthropology in Leipzig, Alemanha, autor líder do novo estudo. "O fato de nossos cérebros serem construídos diferentemente por lipídios pode ser devido ao DNA do Neanderthal."
Desde que pesquisadores no Max Planck sequenciaram o genoma dos Neanderthais, incluindo um genoma de super alta definição de um Neanderthal das Montanhas Altai na Sibéria em dezembro, pesquisadores têm comparado o DNA Neanderthal com aquele de pessoas viventes. Neanderthais, que entraram em extinção 30.000 anos atrás, realizaram cruzamentos mistos com humanos modernos pelo menos uma vez nos últimos 60.000 anos, provavelmente em algum lugar no Oriente Médio. Porque os cruzamentos mistos aconteceram depois que os modernos deixaram a África, os africanos contemporâneos não herdaram nenhum DNA Neanderthal. Mas europeus e asiáticos viventes herdaram uma pequena quantidade - 1% a 4% em média. Até agora, cientistas têm averiguado que diferentes populações de humanos viventes herdam a versão Neanderthal de genes que causam diabetes, lúpus, e doença de Crohn, além de alterarem o sistema imunológico e também afetarem o funcionamento da proteína queratina na pele, unhas e cabelos.
No estudo mais recente, publicado online hoje na revista Nature Communications, Khaitovitch e sua equipe internacional analisaram a distribuição de variantes do gene Neandertal no genoma de 11 populações da África, Ásia e Europa. Eles averiguaram que em comparação aos asiáticos, europeus herdaram três vezes mais os genes relacionados ao metabolismo de lipídios e à quebra destas gorduras para liberação de energia. (Como esperado, africanos não continham nenhum destes variantes Neanderthais.) A diferença no número de genes Neanderthais envolvidos com o processamento de lipídios foi "gigante",diz Khaitovich. O estudo também oferece outro exemplo de legado genético de longo prazo deixado em alguns povos hoje pelos extintos Neanderthais.
Embora a equipe não saiba a função destes variantes de genes Neandertais, começou-se a pesquisar por sua influência ao examinar o tecido cerebral do córtex pré-frontal de 14 indivíduos adultos cuja ascendência remonta a europeus, africanos e asiáticos, bem como de 14 chimpanzés. Embora Khaitovich acredite que o gene Neandertal afete a composição da gordura por todo o corpo, os pesquisadores focaram primeiramente no tecido cerebral porque ele contém muitos ácidos graxos - e estava disponível em banco de tecidos cerebrais. "Não há banco de tecido de gordura corporal para as diferentes populações", ele ressalva.
A equipe averiguou que os europeus tinham diferenças na concentração de vários ácidos graxos no cérebro, que não eram encontrados nos asiáticos nem tampouco nos chimpanzés, o que sugere que estes tenham se desenvolvido recentemente (estes quem??). Entre os europeus também foram notadas diferenças na função de enzimas que são conhecidas por estarem envolvidas com o metabolismo da gordura no cérebro.
Agora a equipe está tentando descobrir como os ácidos graxos agem no cérebro e como diferenças em concentração podem afetar sua função. "Nós pensamos que é um efeito muito forte com profundas mudanças fisiológicas", diz Khaitovich. "De outra forma, nós não os veríamos no tecido cerebral".
Ele suspeita que estes genes de ácidos graxos foram vantajosos para os humanos modernos e podem haver ajudado Neanderthais e, mais tarde, europeus a se adaptar a ambientes gelados. As variantes genéticas podem ter impulsionado o metabolismo, talvez ajudando europeus e Neanderthais a quebrar mais rapidamente a gordura para obter energia a fim de sobreviver às temperaturas frias da Europa setentrional. Os resultados também mostram como um tipo de humano poderia pegar um atalho evolucionário e herdar genes vantajosos de outro grupo através de "introgressão", ou cruzamento misto, ao invés de gastar dezenas de milhares de anos desenvolvendo por si mesmos um caminho para se adaptar a um novo habitat. Hoje, entretanto estes ácidos graxos estão relacionados com doenças que são parte da chamada "síndrome metabólica" - obesidade, diabetes (através do metabolismo de açúcares), alta pressão sanguínea, e doenças cardiovasculares (através do metabolismo do colesterol e triglicerídios), diz o autor.
"Claramente muito mais há que ser feito sobre a funcionalidade dos ácidos graxos, mas é tentador pensar que estão ligados a certos tipos de diferenças no metabolismo do açúcar", escreve em e-mail o paleantropólogo Chris Stringer, do Natural History Museum in London, que não é um membro da equipe. "Neanderthais podem ter passado por adaptações para atravessar o estresse dos invernos do Norte, o que foi selecionado, por introgressão, pelos modernos."