Um jovem de 27 anos de idade. Muito feio, com dentes pequenos e afiados, olhos esbugalhados e face 30% menor que a média da população. Seu cabes cabelos longos e sebosos chegavam aos ombros. Magro e pequeno, tinha aparência pelo menos 10 anos mais velha por conta de seu estilo de vida acelerado. Levava a vida como um caminho - curto ou longo, que seja! viver e morrer: uma aposta - para a morte, e portanto gostava de passar seu tempo livre em círculos degradantes de prazer e luxúria. Viver para perecer - e fazer isso com estilo: ser o degenerado que inspira as futuras gerações da distopia cinzenta que é a cidade de São Paulo.
Pensava "Que as minas fodam sozinhas suas bucetas sangrentas ou que arranjem longe de mim um otário babão para cair em seus feitiços. Olha bem para o meu rosto, cara - e esbugalhava ainda mais os olhos! - você acha que a bússola da minha vida é a porra de uma buceta? Que culpa tenho eu de ter nascido um animal sexuado? Se eu pudesse seria um urso e hibernaria para sempre, do meu pau o único líquido que sairia seria o mijo. Como não posso, tenho pelo menos tenho dinheiro suficiente para habitar o submundo e descolar uma buceta cheirosinha e apertada quando eu estiver precisando, etc". Também pensava "Por que as atividades que escolho fazer no meu tempo entre-sonos tem que ser convertida em dinheiro - e quanto mais melhor! - para que eu consiga algum prestígio social? Que mundo estúpido!"
Toda a pena que uma vez sentiu de si mesmo e de sua humanidade corrompida fora agora convertida em indiferença a tudo e a todos. Nesse estágio da sua vida não se importava mais com a dicotomia "bem ou mal", ignorava a lei do Karma e seu pensamento era a medida de todas as coisas. "Eu quero, eu preciso. Onde está? Quando e onde?"
Toda a pena que uma vez sentiu de si mesmo e de sua humanidade corrompida fora agora convertida em indiferença a tudo e a todos. Nesse estágio da sua vida não se importava mais com a dicotomia "bem ou mal", ignorava a lei do Karma e seu pensamento era a medida de todas as coisas. "Eu quero, eu preciso. Onde está? Quando e onde?"
Quando o feioso passava em frente ao deplorável prédio nos Campos Elísios onde morava, o quartel-general de sua vida não-ambiciosa e imunda cachorros brigavam, o velho dava pauladas no labrador e o playboy ainda com fone de ouvidos puxava sem muito ímpeto a corrente, gritando "Solta, Réx! Larga o pescoço do cachorro do moço!!!"
Parou em frente à portaria do prédio. Pensou em subir e tomar uma ducha mas não gostou da ideia. Estava com muita sede, e além disso, "que tipo de pessoa se arruma para ir na Lanchonete Kuroda e no Bar do Bin na porra de uma quarta-feira? Foda-se." Percorreu a Rio Branco observando a casa do norte, os negros vendedores de relógio, e o sem-número de bares, dos quais a visão da cerveja gelada impregnou-se nele e silenciosamente guiou seus passos. Já estava na Avenida São João quando irromperam pela calçada dois travestis falando "é aqui" e sumindo porta adentro de um comércio e deixando perplexo o homem que mais ao lado descansava sentado na calçada.
Através da Galeria Olido já estava na calçada em território da Galeria do Rock . Atentos aos vermes que passam de lá para cá com quepe e arma na cintura os ambulantes de rostos reconhecíveis e suas coleções de DVDs piratas estampando japonesas amarelas de cus lisinhos e photoshopados.
Vários grupos de jovens vestidos de preto. Podia se aproximar e conversar com qualquer pessoa ali. Umas piores que os outras, mais embriagadas, mais estriquinadas, mais animadas, mais endemonizados; mais estilosas também. Seu visu inconfundível não era menosprezado: calças jeans desbotadas e justas, um sintético azul e vermelho nos pés, o tronco fino coberto por camiseta preta de qualquer banda mesmo: ele conhecia tudo, rock'n'roll era sua vida. Não fazia questão de trocar de roupa depois do trabalho, apenas trocava a bota preta de catador pelo sneaker.
Muitos anos já frequentando aquele ambiente lhe conferiram experiência. E o rolê era sempre assim: encher a cara e conversar com os nóias para descobrir coisa nova. E pensando nisso desceu a rampa, sentou na cadeira de madeira e pediu um litrão de Skol. Tirou da mochila o copo de chopp largo e alto. Recebeu da encorpada garçonete a garrafa como uma criança recebe o peito inchado da mãe. Botou o copo na mesa, encheu até a borda e sorveu em goladas todo o conteúdo.
Vários grupos de jovens vestidos de preto. Podia se aproximar e conversar com qualquer pessoa ali. Umas piores que os outras, mais embriagadas, mais estriquinadas, mais animadas, mais endemonizados; mais estilosas também. Seu visu inconfundível não era menosprezado: calças jeans desbotadas e justas, um sintético azul e vermelho nos pés, o tronco fino coberto por camiseta preta de qualquer banda mesmo: ele conhecia tudo, rock'n'roll era sua vida. Não fazia questão de trocar de roupa depois do trabalho, apenas trocava a bota preta de catador pelo sneaker.
Muitos anos já frequentando aquele ambiente lhe conferiram experiência. E o rolê era sempre assim: encher a cara e conversar com os nóias para descobrir coisa nova. E pensando nisso desceu a rampa, sentou na cadeira de madeira e pediu um litrão de Skol. Tirou da mochila o copo de chopp largo e alto. Recebeu da encorpada garçonete a garrafa como uma criança recebe o peito inchado da mãe. Botou o copo na mesa, encheu até a borda e sorveu em goladas todo o conteúdo.
"Saúde!"
Sentado sozinho e impaciente na mesa pensava sobre a insignificância da vida. Niilismo de mais baixo nível. A única coisa que achava que possuía era seu corpo, sujo e podre. Um corpo em contínuo progresso de definhamento. Gostava de sofrer: corpo malhado pela dor de carregar peso físico no trabalho, e mente cheia de nós que impediam o pensamento de seguir livre em frente. Sentia saudades da época em que era sensível ao álcool e tinha ressacas. Foi ao banheiro, bateu uma punheta e gozou na própria mão enquanto nutria o pensamento de que:
"Depois de viver esta vida nefasta e cheia de contradições que estilhaçam minha consciência - a própria encarnação do Demônio auto-indulgente e destituído de qualquer moral ou culpa - vou morrer, a carne do corpo defunto vai apodrecer e nada além da ossada sobrará. A essa altura "eu" já não vou mais existir. Uma fagulha de vida que se apagou. Vou dormir eternamente, e sem jamais sonhar."
Engoliu a própria porra, destrancou o ferrolho de metal e saiu do banheiro. No balcão avistou Lima rindo muito alto com sua boca escancarada cheia de dentes podres.
"HAHAHAHAHAH eu lembro de quando eu era pivete e andava com a camiseta do Iron Maiden e ia fazer corre na favela. eu ia lá tantas vezes...! quando eu aparecia lá de madrugada os caras já até sabiam o que eu queria. eles falavam assim olha lá o metaleiro. dá a farinha do metaleiro! HAHAHAHAHAHA"
Sentou ao lado de Lima, esse velho gárgula preto que gostava de iniciar os mais novos nos prazeres da coca. Lembrou-se de quando o conheceu ali na Galeria e disse que nunca havia cheirado nenhuma vez. Nessa ocasião Lima riu tanto até perder o fôlego e tossir. Dava murros no balcão de mármore acinzentado molhado pelo suor das garrafas de cerveja, e quando a costela já doía de tanto rir perguntava em tom de chacota e limpando a lágrima dos olhos
"nunca?!" e continuava a rir.
Por fim, concluiu a sedução ao adicionar
"Aparece aí sábado que vem no meu aniversário, meu garoto! Eu trago para você! HAHAHAHAHA"
No começo estranhou a ideia "Por que alguém comemoraria o aniversário aqui nesse pulgueiro? Pra poder convidar todos os nóias da São João, só se for..." Mas não hesitou. No sábado deu aquele tiro com Lima e sentiu pela primeira vez sua face adormecida, seu cérebro selado por rédeas firmes, a concentração nas alturas e o movimento dos carros na metrópole lá fora em câmera lenta. Andou pelo centro escuro naquela noite observando Lua brilhante lá em cima, e se sentiu mais seguro do que nunca. Se algum indigente quisesse assaltá-lo tinha certeza de que conseguiria arrancar com as mãos o pescoço do filho da puta e comer seus olhos crocantes e crus.
Mas hoje estava suave. Lima passou um lenço no nariz, pediu mais uma garrafa de cerveja e foi ao banheiro.
Mas hoje estava suave. Lima passou um lenço no nariz, pediu mais uma garrafa de cerveja e foi ao banheiro.
O feioso levantou e ficou parado em frente ao bar com seu copo de chopp personalizado. Ali parado não deixou de ser cumprimentado por todos os que passavam. Toques de mão estridentes e ecoantes com a molecada, e beijos na mão e fungada no pescoço das gatinhas cheirosas. As velhas e os velhos donos dos botecos invariavelmente o cumprimentavam com beijos na testa. Apesar de feio, seu riso era sincero e inspirava alegria. Não aquela alegria de positividade e otimismo, mas aquele tesão pela vida próprio da pessoas sanguíneas, ativas e desapegadas.
Com seu ritmo de conversa espalhafatosa e incansável ria alto e todos riam juntos.
Um rapaz muito bonito, muito querido, e que não ia durar muito. O mundo precisa de mais gente assim, de mais artistas, dissidentes e teimosos. Cada um escolhe seu veneno, e se você achar que vive melhor que outra pessoa: surpresa!: você também vai morrer. Prefiro os que morrem de alguma coisa àqueles que morem de nada, de diabetes, de hipertensão ou de ódio e inveja mesmo.
Como diria o Poeta do Submundo: "Sem neurose. Cada um sabe o dom, e o dom é o tamanho da dose. Não tenho explicações a fazer. Quem sabe de mim sou eu, quem sabe de você, é você."
Porque se a cidade fosse composta só por gente cretinamente obediente, gente engravatada que só demonstra simpatia a quem tem a cara bonita, que ri sem vontade e não sabe conversar nada além de preços e trivialidades clichês sobre temas mundanos e idiotas, gente que trabalha para comprar e tira férias para descansar e descansa para trabalhar mais e encher egoisticamente o rabo de dinheiro em ganância, os amantes do ouro...
(Desse conjunto acrítico e individualisticamente indiferente se exclui a população, a massa mal-educada filha do lixo-histórico Ocidental sul-americano que é o Pais, sem oportunidade nem perspectiva de sair da marginalidade, o imigrante que batalha, o favelado, os nóias, a mulher-dona-de-casa-esposa-mãe-e-trabalhadora que pega metro e gira todo dia a engrenagem triturante do Sistema cujo peso cai como bigorna todo dia sobre suas costas arreadas)...
... enfim, se a cidade fosse composta só de gente mesquinha e inescrupulosa que pensa ser a educação apenas um degrau ou palanque para que se fique mais bem qualificado a ter sua energia vital sugada pelas corporações e necessariamente pisar com pesadas botas de couro nas costas de seus irmãos trabalhadores humanos menores, se o mundo dependesse só desse tipo de gente que ignora a consciência histórica e a relação de causalidade entre fatos, então seria um lugar muito mais cinza, estéril e perverso.
Salve, feioso! "Somos poucos mas somos loucos."
(Desse conjunto acrítico e individualisticamente indiferente se exclui a população, a massa mal-educada filha do lixo-histórico Ocidental sul-americano que é o Pais, sem oportunidade nem perspectiva de sair da marginalidade, o imigrante que batalha, o favelado, os nóias, a mulher-dona-de-casa-esposa-mãe-e-trabalhadora que pega metro e gira todo dia a engrenagem triturante do Sistema cujo peso cai como bigorna todo dia sobre suas costas arreadas)...
... enfim, se a cidade fosse composta só de gente mesquinha e inescrupulosa que pensa ser a educação apenas um degrau ou palanque para que se fique mais bem qualificado a ter sua energia vital sugada pelas corporações e necessariamente pisar com pesadas botas de couro nas costas de seus irmãos trabalhadores humanos menores, se o mundo dependesse só desse tipo de gente que ignora a consciência histórica e a relação de causalidade entre fatos, então seria um lugar muito mais cinza, estéril e perverso.
Salve, feioso! "Somos poucos mas somos loucos."
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