quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Alguns trechos do livro "Yoga para Nervosos" do Hermógenes

Sobre a metafísica da Yoga (além da matéria):

Desde os primórdios da humanidade, a ciência de curar era psicossomática, isto é, não se cingia apenas a tratar do corpo. Os pajés, os feiticeiros, os medicine man, os chamemos de todas as tribos foram precursores da moderna medicina psicossomática. Seus cerimoniais, amuletos, trabalhos de magia, tinham poder curador porque atuavam a partir do plano mais sutil, e por isto mesmo, mais poderoso: o psiquismo.

Enquanto a moderna medicina psicossomática vir o homem apenas em seus níveis mais densos - o físico e o psíquico - ainda estará tratando de um homem incompleto.

O homem integral é visto pelas escolas hinduístas como formado por cinco koshas ou revestimentos, que vão se quintessenciando a partir do corpo físico até atingir o mais sutil, onde não há nada de material e concreto, formal e pessoal, que é o plano da mais pura bem-aventurança. Entre o físico e o mental, como intermediário há o organismo energético, formado de prâna ou bioenergia, que dá vitalidade ao todo orgânico, sendo o élan dinamizante de cada função orgânica. Acima do plano propriamente mental, há um plano metafísico, que é o da intuição filosófica.

Nosso corpo mais denso, isto é, o organismo físico, não passa de um agregado de matéria, formado exatamente pelos alimentos que consumimos. Um cadáver é este agregado de material tirado dos alimentos, no qual os órgãos não trabalham, por falta do élan dinamizante, isto é, do prâna. Por isso mesmo o prâna é a própria vida. "Do pó da terra formou Deus Jehovah ao homem, e soprou-lhe nas narinas o fôlego da vida; e o homem e tornou um ser vivente" (Gen. 2-7). É assim que a Bíblia descreve a gênese do homem em seus planos mais densos.

Os planos mais sutis, mais abstratos, menos materiais, menos pessoais, menos limitados pela forma, por isso mesmo mais próximos do Infinito e da Eternidade, são mais poderosos do que os que estão presos no tempo e nas formas. Do mesmo jeito que a fissão desprende energia incomparavelmente superior à liberada pelos fenômenos eletrônicos e estes, por sua vez, maior do que os motores a vapor, as energias espirituais são incomparavelmente superiores às mentais; e estas, por sua vez, às físicas. Dito isto, pode-se compreender por que uma mudança fundamental de orientação espiritual ou filosófica da nossa vida tem o fantástico poder de harmonizar e limpar a mente, bem como restaurar a normalidade orgânica, com a conquista de uma saúde melhor.

O gozo material e vulgar não pode ser antídoto para a dor existencial. Esta só pode ser vencida com a realização do que é essencial, isto é, do Espírito. 

Dualidade

A filosofia yogui poderá até ser chamada de pessimista, quando mostra ser este mundo maiávico (ilusório) feito de experiência dolorosa, concluindo que viver é conviver com a dor. 
O Yoga é portanto uma filosofia da Realidade: nem pessimista nem otimista. Afirma ser a Realidade, em sua manifestação ilusória, feita de opostos: luz e sombra; alegria e tristeza; riqueza e pobreza [...].
O yoguin é permanentemente sereno e equânime, isolado da dualidade, longe do alcance das fugazes manifestações do Real.

Viveka (discriminação):

O mundo não é ilusório inteiramente. Não é somente maya (ilusão). A cobra não é de mentira. É real. O mundo o é na medida e extensão em que consegue gerar medo ou apego. As reações somáticas do amedrontado emprestam realidade àquilo que lhe dá causa. E, enquanto a cobra for uma apavorante realidade, a corda não é vista e, portanto, não tem realidade embora seja Real. Dessa maneira o mundo fenomênico, isto é, o que vemos e sentimos é uma realidade, na medida e extensão dos efeitos que em nós provocam as suas delícias ou suas misérias. E, enquanto tiver o poder de nos fazer sofrer ou gozar, a Realidade Divina, é apenas como devaneio de místico. Somente viveka nos desipnotiza a mente para a contemplação do Transcendente, que se esconde atrás do imanente visível. É viveka que nos pode alcançar à visão do Uno, que a multiplicidade esconde, e conduzir-nos à vivência de Deus, que o processo mundanal impede.

Vichara (auto-pesquisa):

Ninguém é tão bom como orgulhosamente se acredita, nem tão inferior quanto pessimistamente pensa ser.
Cada um de nós é - quando livre da ilusão - a própria Realidade. O homem foi feito à imagem e semelhança de Deus. Não é o que se sabe?! - Pois bem, vamos procurar Deus através de conhecer aquilo que somos, descartando-nos, para isto, dos falsos juízos que de nós fazemos.

Tanto o sentimento de inferioridade como seu oposto são produto do egoísmo.

Sakshi (testemunha silente):

O homem vulgar é comumente diluído dentro do ambiente em que se encontra. O mundano o contamina, fascina, absorve e consome. Dele pouco sobra verídico e imune. É visando a evitar o contato, e defender a sua mente, eu caráter, suas virtudes, que alguns místicos se fazem eremitas e fogem para o ermo. Quem desenvolve esta sadia atitude espiritual e psicológica chamada sakshi realizando a isenção, não obstante vivendo em contiguidade física com o mundano, fica espiritualmente, à parte. Não se perde. Não se confunde. Não se identifica. Não se corrompe.

A humanidade "stressada" está precisando da ajuda dos poucos isentos homens sadios e sábios, que ainda conservam lucidez e coerência e que, portanto, podem fazer algo por ela.

Identificação:

Aquilo que quando nos falta nos dá infelicidade é objeto de nossa identificação. Somos identificados ao que ansiosa e desastrosamente queremos conservar, melhorar, desenvolver...

Enquanto o pobre homem identificado é joguete ao sabor das circunstâncias incontroláveis na tempestuosa atmosfera da matéria, o yoguim vivendo no Espírito, não se deixa apanhar nas malhas da ansiedade e não cai presa da "coisa".

Desidentificar-se com o mundo de Deus, e identificar-se com o Deus do mundo.

Um imaturo vai ao cinema e goza e sofre respectivamente com as vitórias e derrotas do herói ao qual se identifica. Seus nervos, glândulas e vísceras são fundamentalmente sacudidos pelos acontecimentos do mundo mítico criado pela fita. Uma pessoa de espírito crítico e amadurecido, conhecedora da técnica e arte cinematográficas, sabe "dar o desconto", e assiste ao filme, dizendo para si mesmo: "não é comigo"; "eu não sou aquele personagem"; "tudo é uma ilusão".

Ideia: criar um texto no qual eu me fundo diluo no protagonista.

Somos deuses:

Para tais pessoas que confundem humildade com humilhação autodestrutiva, um dia escrevi: "Quando eu disse ao caroço de laranja que dentro dele dormia um laranjal inteirinho, ele sorriu e zombou de mim e se mostrou estupidamente incrédulo.
Tu és semente da Eternidade, do Infinito..."

Ateus e materialistas:

Primeiro de tudo: Deus é alcançado através do caminho da ciência, filosofia e meditação.
Ateu: quem afastou Deus da sua vida, mas ateu quanto a qual Deus?
Tipos de ateu:
ateu semi-cientista, com vaidade intelectual;
ateu zangado pois pediu e não recebeu, egoísta;

Sankalpayama (controle sobre a imaginação):

Não é o fato de ficarmos a imaginar que vai acontecer algo de mal que nos tira a calma?
Os preocupados geralmente são homens de imaginação fecunda. Os gênios, também o são.
Aprenda a perceber os momentos em que sua imaginação é quem está dirigindo você e não você a ela.
Use o ilimitado poder da imaginação para fazer de si mesmo um retrato mental positivo. Imagine-se cada dia mais vitorioso, sereno, iluminado, forte, equânime, senhor de sua mente, cheio de saúde, de alegria, de amor universal, um homem redimido.

Seva (agir no mundo visando à felicidade dos outros):

Quem ajuda é o mesmo que recebe ajuda, em termos do Absoluto Uno. Quem ajuda aos outros o faz por ter certeza de que o outro não existe fora de si mesmo, e que a separação é maya; o que faz é na convicção de que Deus Uno é quem dá e é quem recebe. Quem assim age está livre de aspirar reconhecimento, retribuição ou recompensa. Não visa nem mesmo a conquistar um lugarzinho no céu. Não se utiliza dos necessitados como instrumento de egoísticos planos de "salvação" ou "indulgências".
Esta é a ação reta de que fala o Budismo.

Karma yoga:

Prestar serviços a Deus na pessoa do próximo.

O karma yogui não se julga o autor das obras. Vive como instrumento nas mãos do verdadeiro obreiro: Deus.

De hoje em diante não creditarei a mim mesmo a autoria das boas obras. 

Saiba ocupar-se:

Yoga corresponde à filosofia da ação, o que é diferente de inação. Em verdade, Yoga representa terapêutica contra a agitação. Não importa a aparente humildade da obra, com a Yoga cada ação é banhada em devoção e integração.

O sábio, somente se ocupa. Não se preocupa. Não se pós-ocupa. Não se consome no que está por vir. Não se empenha no que passou. Não sofre na espera. Não se martiriza rememorando. Ele segue o ensino bíblico, vivendo seu dia e deixando que o ontem ou amanhã cuidem de si mesmos.
Não quer dizer que seja imprudente e irresponsável, mas acha que não é inteligente começar a dançar antes que a música toque nem continuam dançando depois que ela finda.

Asanga:

O yoguin aplaca a sede dos sentidos (indriyas). Sanga significa viver para gratificar os sentidos, e representa a servidão, pois os sentidos são indiscutivelmente insaciáveis. Asanga significa a negação dos prazeres sensuais, e leva à liberdade.
O erotismo está expulsando do mundo a poesia. A sensualidade grossa está vencendo a capacidade de gozar o sutil.
Sou uma pessoa de sensibilidade refinada.

O mendigo e o abastado:

Ninguém é mendigo pelo que não possui, e sim pelo que anda mendigando. Ninguém é rico pelo que tem, mas pela espontânea prodigalidade com que distribui.

Se você tem cometido o erro de se reconhecer vazio de muitas coisas e, no sentido de preenchê-las, vive a solicitar do mundo e dos outro que lhe concedam favores, que lhe atendam os rogos, você dificilmente será feliz. Primeiro, porque o mundo e as pessoas não gostam de atender aos vazios, aos indigentes, aos dependentes, aos que se reconhecem fracos, incompletos, carentes de respeito, desamados, incompreendidos, necessitados, deserdados... Em segundo lugar, porque você se está enterrando na infelicidade ainda mais, pelo fato de reconhecer-se carente, decaído, necessitado, fraco, incapaz, miserável;  por estar criando um auto-retrato negativo e mórbido.

Os bens materiais podem, materialmente, diminuir, na medida em que os esbanjamos. Os bens espirituais, ao contrário, crescem na proporção que com eles beneficiamos os outros.

Contentamento (santosha):

Se, para vencer uma carência, o contentamento é valioso, para a manutenção de um estado de razoável tranquilidade o é ainda mais. Aliás, não haverá paz enquanto cobiçarmos algo, mesmo que seja a própria a paz. Não alcança o céu quem por ele e consome de ansiedade. Uma forma de cair no inferno é tornar-se ansioso por ganhar o céu. Há um querer sereno, sem luta, sem tensões que abre a porta da vitória. Aprenda isso.

Contentar-se com o simples contentamento, e isto inclui contentar-se com o que ainda não sou, ou ainda não consegui ser.

Não é satisfazer a insatisfação que nos faz felizes. O não ter insatisfação, sim.

Sama bhava:

Até ontem eu dividia as coisas e as situações sob critério estreito do meu egoísmo.
Sem qualquer serenidade, era atirado de um lado para outro, totalmente manobrado por acontecimentos externos a mim. Do extremo da alegria sem sobriedade era quase sempre lançado no vale do amargor sem esperança, em função do julgamento que fazia dos fatos, no ritmo e na alternância dos opostos da existência.

Hoje, menos egoísta, nada que ocorra pode desequilibrar-me. Hoje, com sama bhava, infenso à dança dos opostos, nada me leva a exageros de alegria, nada me pode deprimir e aborrecer.

Não capitule:

Valorizo meu equilíbrio, sobriedade, tempo e saúde.

É provável que a vulgaridade não entenda nem perdoe alguém que se nega a vulgarizar-se, e agrida você. Mas você deve lembrar-se, de que os raros autênticos, são indispensáveis para servirem de esteio, de pontos de apoio, de orientação ao homem comum, escorregadio e amorfo.

Bhakti:

Ame a Onipresença Manifesta em tudo e não somente vença a dor, mas seja um comensal da Suprema Beatitude.

"Extremamente queridos, por mim, são aqueles que me consideram o Fim Supremo, e, dotados de fé e devoção, seguem esta religião-néctar" (Gita)

Satsanga:

É para fazer satsanga, que você deveria comparecer aos cultos públicos de sua igreja, aos concertos, aos centros de estudos, onde se cultiva a vida espiritual.

Nenhum comentário:

Postar um comentário