segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Comunicação telepática de corpos e linguagem corporal.

Vi uma loira de blusa rosa sentada no banco do metro a uns 5 metros de mim. Estava sentado do lado de um cara e suas pernas soltas e estendidas indicavam que estava relaxada.

Eu mais interessado numa japonesa gorda com blusão preto de moletom que lia algum livro com a foto de Mao Tsé-Tung na capa.

O metrô parou no Paraíso e subiu uma coroa de uns 40 anos com óculos escuros e mechas verdes no cabelo preto e curto. Tinha um relógio biteludo e prateado no punho direito com que segurava a barra de metal ao meu lado.

Eu quis sair do banco de idosos, levantei e fui parar no meio do corredor ao lado de um daqueles lunáticos magros de cabelos longos que lhes cobrem sensualmente trechos da face. Vestia uma camiseta branca suja em que se lia "i don't want to live forever". A 50 centímetros de mim ele se pendurava pelo baluarte do vagão e ficava suspenso a uns 5 centímetros do chão. Fazia movimentos como se estivesse suspenso em gravidade lunar. Parecia estar em viagem eterna de ácido.

Me senti confortável pois nesse momento era ele e não eu que estava atraindo os olhares dos homens e mulheres desinteressados que olham ansiosamente da tela do celular para a janela do vagão e o olhar passa lá fora por um prédio vazio cinza no horizonte e de volta ao interior do vagão frio e asséptico.

Depois que o lunático desceu eu me sentei ao lado da loira rosada, me aconcheguei no assento, peguei meu livro e passei a devorá-lo com os olhos. Jack Kerouac na minha mão.

Na São Bento entram duas mulheres uma mulata com a cabeça que parecia uma caixa d'água azul de 1000 litros e outra  sofrida e raquítica velha. A velha me perguntou se a estação Tietê tinha mudado o nome para Portuguesa-Tietê e eu disse que sim e apontei o letreiro em cima da porta a loira também olhou e eu disse "a estação Jardim São Paulo também mudou, agora é Jardim São Paulo-Airtom Senna" e as duas mulheres deram um sorriso que estava longe de ter significado "entendi".

Voltei para o livro. A loira voltou ao seu lugar feminino e imperturbável de completude.

lendo On the Road na minha mão.

Tiradentes. ela olha discretamente para o meu lado. relaxo e estendo a perna direta e cerco a loira no banco ao lado sentada.

Túnel. viro a cabeça para os lados, paro o olhar por 2 segundos e reparo o nariz pontiagudo que denuncia alguma ascendência italiana, e a linha fina e sinuosa do delineador em volta dos olhos dela. Tem de 17 a 21 anos.

Quando o vidro amplo e translúcido da janela recebia a luz no trem recém-saído do túnel ela joga com vontade os cabelos loiros para o meu lado do assento.Junto com o pó dos cabelos subiu também um delicioso perfume floral. Senti frio na barriga. Me aconcheguei mais ainda, fechei o livro e inspirei profundamente de olhos fechados olhando para frente. Chegamos no Armênia.

Ela ouvindo música e balançando a cabecinha. Olho mais uma vez ao lado e reparo a cor rosa do seu moletom com bolinhas por conta do uso prolongado ou descuido mesmo.

Penso em perguntar qualquer coisa mas me contento em apreciar aquela presença de uma forma mais telepática que de paquera. além do mais, ela estava usando fone de ouvido. Estamos um sentindo a presença do outro.

O que faz um homem é a gravata, e ela começa a se ajeitar no banco, me toca nos ombros, dá um abraço em si mesma, e olho próxima das minhas costelas sua mão direita com unhas roídas e dedos magros.

Tietê. a velha desceu e eu nem percebi.

Carandiru. Falar sobre o que? sobre o tempo? O ideal seria perguntar o nome, e saber onde vai descer, e acompanhar conversando até.... e me perco em devaneios. Inspiro mais uma vez aquela fragrância de fascínio, e o céu nublado como é em São Paulo. Aproveito os últimos momentos dessa companhia perfumada e aconchegante.

Ela literalmente me dá uma cotovelada.  Meu coração bate intensamente e sinto meu pau despertando. Mas não vai ser hoje que vou agir, a lição de hoje é a) atração e comunicação de corpos; b) linguagem corporal.

Santana. Ela se levanta e posta-se diante da porta na minha frente. É mais magrinha e menor do que eu pensava. Vira e olha por cima de mim, ela na minha frente, eu olhando com admiração de cima abaixo e de baixo acima, nossos olhares se cruzam, eu relaxado e satisfeito, ela convicta e absoluta, porta abre e ela vai embora.

Deslizo no banco, coloco o all-star branco no banco de idoso azul celeste e leio o livro de Jack Keuroac.


"Pelo contrário, o nervoso encontra obstáculos no seu excesso de atividade psíquica. A ideia a realizar toma para ele proporções enormes, os resultados que ela promete exaltam-nos; parece-lhe, em pouco tempo, obter a realização de tudo.
Esta grande emoção provocada pela ideia causa-lhe um enfraquecimento nervoso; vem, então, a idéia dos obstáculos, das lutas a sustentar, e o fim a alcançar fica no tinteiro. Se, porém, em vez de deter-se a considerar os resultados possíveis, o nervoso reagisse contra as suas tendências mentais por um pequeno exercício de movimento, cortaria num momento as cabeças da hidra mental que nele tenta desenvolver-se"

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