terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Conhecimento obtenível pela intuição, mas que auxiliado pelo texto eu realizei.

Paradigma da Física Quântica: a "realidade" depende do ponto de vista, e no limite todos os resultados a um experimento são possíveis.

A Física Quântica, por sua vez, sugere que os átomos não são realmente coisas, são probabilidades ou tendências que surgem em relação a nossa observação, isto é, a percepção e objeto são interdependentes, os átomos não têm existência absoluta ou separada de nossa interação com eles (ao menos em grande parte das interpretações, como a de Heisenberg e Bohr). Assim, tudo o que chamamos "coisas" está feito de "não-coisas", e portanto é absurdo falar que há um mundo objetivo, concreto e material lá fora.

Avydia: ignorância ou desconhecimento da natureza una da consciência (isto quer dizer que as pessoas têm mente com mesma frequência e a comunicação de pensamentos e emoções é possível,sim!)

O budismo defende que o corpo é criado pela mente, especificamente pela confusão (avidya) que é produzida quando a mente não se reconhece como a fonte de todos os fenômenos que surgem. O universo por natureza é criativo, e fenômenos estão constantemente surgindo - o que o budismo ensina é que estes fenômenos são correspondentes à mente, são não-duais com a cognição. O processo de materialização é produzido quando a mente concebe esta criatividade/cognitividade (luz/consciência indivisível), que é infinita, como algo separado de si mesma. Assim surge o constructo sujeito-objeto que dá lugar ao samsara.

O mundo material é manifestação residual de movimentos noutra realidade.

Todas as aparências sempre são nada mais do que o ornamento da pureza primordial e a espontaneidade luminosa. Quando a cognitividade luminosa da sabedoria inata se confunde e percebe a si mesma como uma entidade subjetiva(=dual, dicotômica entre sujeito e objeto), veste-se de um corpo, um mundo, um reino... 

A mente desencarnada nos reinos loka

Ao morrer, segundo ensina o budismo tibetano, a consciência separa-se do corpo e entra em espaços intermediários chamados bardos, onde se apresentam diferentes imagens que são projeções da mente, nas quais se tem a oportunidade de reconhecer a "luz clara", esta cognitividade luminosa que é a manifestação primordial (o Dharmakaya). Todavia, poucos são capazes de reconhecer os próprios fenômenos de sua mente, por questões kármicas e por falta de prática. Assim, depois de um certo processo, a mente se identifica com uma das imagens que aparecem e toma um corpo, por exemplo, vê um casal tendo intercurso sexual e se identifica com a mulher ou com o homem e então encarna. 

Budismo in a nutshell: a vacuidade cujo karma é nulo está descompromissada com  a separação entre sujeito-objeto.

Um sofrimento que emerge da carência de plenitude do estado primordial da mente, que é integração em si mesmo da totalidade (diz-se que o corpo búdico é a totalidade do universo como desprendido de sua própria energia). A não-dualidade necessariamente anula a formação de um sujeito e um objeto, de alguém que percebe e de algo que é percebido. Existe um estado, que é a própria realidade, no qual há cognição, há gozo, há existência mas não há nenhuma separação (não há um eu com seu universo de objetos) e portanto não há sofrimento nem desejo. O universo segue aparecendo, despregando-se em sua infinita variabilidade, mas estas aparições são a unidade indivisível da cognição (vidya em sânscrito, rigpa em tibetano) e a manifestação, ou a unidade da luminosidade e do espaço. A forma é vacuidade; a vacuidade é forma.



Síntese: a manifestação do espírito em forma de matéria consiste em desengano guiado por desejo e karma, que produz o desprendimento do vácuo-uno, criando sujeito e objeto.

O jogo de causa e efeito condiciona esta energia para que apareça como formas. Estas formas são nosso mundo e ser. O mundo, e todos os mundos, coincidem com a essência da cognitividade [awareness], que é não-nascida e imortal, e está absolutamente livre das implicações da forma e do limite. O mundo manifesto não é outra coisa que a essência, mas esta essência não está limitada pela forma ou pelas condições dos mundos manifestos. Alguém poderia dizer que o mundo e todos os mundos sustentam-se como forma pela intenção condicionada e habitual da consciência. Nosso mundo particular se sustenta conjuntamente pela intenção dos seres humanos. Os mundos de outros seres sustentam-se pela força de sua intenção condicionada. As estruturas da existência não são "reais" em um sentido último. São não-realidade públicas, sonhos lúdicos esculpidos pela essência e modelados como formas. São a irradiação da potência pura, momentaneamente esculpidos pela intenção e mantidos em um padrão aparentemente coerente pelo karma ou os padrões da consciência habituada.

Traduzido e adaptado de: http://pijamasurf.com/2016/12/como_la_mente_crea_el_cuerpo/

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Eu desgosto deste tom

Boa tarde para quem acordou recebendo uma surpresa pelos correios:
"A Transformação Interior" - pequeno volume enviado de Curitiba e chegado até aqui na periferia da Zona Norte paulistana, contendo o supra-sumo devocional procedente das antigas escolas de Mistério do Egito.
Meditação e alquimia espiritual, atitude altruísta mas também de comunhão: a pegada para deixar brilhar a Luz Divina através do Silêncio Interior, harmonizando a consciência humana com os objetivos do Criador em sua Grande Obra.
Se todas as coisas estão ligadas por fios invisíveis de interdependência, a picadilha cultural para o Novo Milênio é dixavar os caminhos internos que levam este Eu até o Infinito.

Quê dizer da AMORC, esta escola filosófica que conheço há tão pouco tempo e já considero pacas?
Sim, 2016 ainda não acabou!

terça-feira, 20 de dezembro de 2016

conto inacabado em que não acontece nada (risos)

Meio minuto de interação com um estrupício é o suficiente para dar conta do absurdo que é a estupidez humana.  

Havia recentemente realizado o prazer da invasão de propriedade, ou como preferia dizer "o escoltamento das facilidades espaciais na periferia suburbana" - isto é, andava pelas calçadas como se andasse no game GTA. 

Vinha caminhando pela avenida principal, sem novidades, quando de um surto dobrou à esquerda, adentrando uma viela desconhecida e suspeita, ao longo da qual só havia carros estacionados, e no final do caminho um altíssimo portão de ferro fazendo bloqueio - estímulo real para exploração. 

Foi que foi, ultrapassou o portão, cruzou o grande terreno com os braços cruzados e passos seguros como quem não queria nada, e de uma galgada ascendeu à margem do riacho que corria ao fundo, oculto naquela paisagem misteriosa. O cachorro sentinela fazia a sesta resfolegando na casinha à sombra e nem se deu conta do maluco que agora pisava com as havaianas pretas sobre o capim molhado, a bosta de cavalo e sobre todo o tipo de entulho que há ao curso deste sem-número de córregos mal-cuidados de quebrada. 

Uma escada alta como a Estátua da Liberdade encostada na lateral do muro no terreno ermo foi convite para subir e observar do alto os telhados e quarteirões de toda a quebrada ao longo da avenida principal. Atrás de si os raios de sol dardejavam por entre as nuvens iluminando com fachos espessos de luz o esplendoroso paredão dos casebres laranja de tijolo baiano descoberto.

Desceu a escada e continuou pelo trecho plano que margeava as águas acinzentadas do pobre rio, no curso do qual aparecia a face traseira das casas, usada geralmente para varanda, onde havia infinitos varais com séries de peças multicoloridas secando ao vento. 

Na encruzilhada, seguiu pela vereda rodeada de capim muito alto e sob o pé de uma bananeira macabra fez reverência ao capeta, mas não querendo ficar ali por muito tempo, decidiu manter foco na missão e logo encontrou uma firme ponte de metal que cruzava as duas margens do rio. Pendurou-se na plataforma com toda sua força, subiu também as pernas fazendo contraponto com os pés no tronco de uma árvore e, abandonando aquelas paragens sorrateiras, apressou o passo para o seu destino.

Estava agora se aproximando da mesa, situada no jardim, à qual estava sentado o avô desta garota com quem estava saindo. Tomava-se chá. Há 20 anos o velho tinha problema nos rins, o que deixava sua pele esbranquiçada como a troca de pele de uma cobra, e seus olhos de um claro anormal que lembrava o branco do leite. A mesa estava cercada por muros cobertos por folhas de trepadeira, e em um deles havia um pequeno portão de madeira por onde as pessoas acessavam o recinto, que no alto estava parcialmente coberto por uma parreira.

O velho balbuciou qualquer coisa, e ficou encarando com perplexidade o jovem, que sem saber como reagir disse um "boa tarde" tímido, mas o velho em toda sua esquisitice de réptil ancião inquiriu, pronunciando as palavras lentamente:
- Você está falando comigo?
O jovem de pronto respondeu:
- O senhor estava me olhando...
- Você está falando comigo? - indagou de novo o velho, como se o ato de alguém desconhecido dirigir-lhe a palavra fosse ultrajante demais para ser aceito, ou quem sabe raro demais nestes dias de velhice e impessoalidade.
O jovem pensou por alguns segundos e preferiu dissuadir sua própria vontade de interação:
- Não, não estou falando com ninguém! - disse, cruzou os braços e deu as costas.

A coisa mais mundana aconteceu quando o jardineiro estendeu o pescoço por sobre um dos muros como um cuco maníaco de um relógio, e perguntou com os olhos esbugalhados e débeis:
- Seu Pedro, tá tudo certo aí?
Ao que o velho concordou, meneando positivamente a cabeça para cima e para baixo, duas vezes e vagarosamente.

Sim, neste momento ficou claro para o jovem alguma coisa sobre a velhice ou sobre a vida humana em geral.

sábado, 17 de dezembro de 2016


Talvez eu, por poder usar a pena, tenha sido capaz de escrever sobre o espírito da sabedoria. Entretanto, como uma criança

que aprende a falar, posso apenas balbuciar os grandes mistérios; a palavra expressa muito pouco do que o espírito percebe e compreende... – Jacob Boehme
...  para quem escreve, o desafio da incomunicabilidade dos pensamentos é como um passo em falso no degrau da escadaria celeste que não está mais lá; afunda-se em queda livre através do abismo negro da incompreensão e se espatifa na lama de um mar de aflição: criatura desprovida, sem farol nem porto seguro, sem corda de resgate nem voz à qual ouvir, muda diante de ouvidos alheios voluntariamente complacentes mas inúteis.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Breve comentário sobre o filme Natimorto.

Ontologia do valor humano.

O protagonista, misantropo assexuado
apaixona-se pela talentosa cantora e oferece a ela
em primeiro momento, algum entretenimento e confortável acolhimento 
em segundo momento, uma coleção de bad vibes.
Homem que não se encontra e não se valoriza - nunca está satisfeito: não sabe ficar de boa.
Em suma, homem negativo, tipo de ser humano que participa da vida pelo "não": negando sua condição humana mas também exasperando toda sua energia no falso prazer auto-contentado da renúncia mal consumada.

-Escuta aqui, seu lixo, ninguém é obrigado a sentir pena de você. Você não vale nada, e enquanto você não agregar um pouco de Vida a esta sua existência menos do que medíocre, insignificante, ninguém, especialmente nenhuma mulher, tem que sentir o mínimo de empatia por você. 

Seja que nem o Tim Buckley, filho, quem até para se lamentar o fazia de uma maneira bela - com aquela voz e aquela sensibilidade.

Seja que nem um ciclista que pensa com as coxas e sobe pedalando a Rebouças sem medo nem desistência no meio dos carros.

Seja ridículo, esteja mal - seja frágil e vulnerável, estampe na cara o seu desconforto, mas também esteja bem: conduza seu barco de melancolia por vales sombrios até aportar em águas claras onde os barcos amigos aguardam com estandartes alteados.

Seja, adorne-se, pinte-se, vista-se.

Seja, mas se preserve.

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Curado pelo amor

É disso que estou falando: quando se não perde tempo com constrangimentos, a mente voa alto para atingir o sublime. Em nome do amor vou enfrentar toda a minha neurose para estar livre e realizar meus sonhos.

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textinho singelo e muito íntimo que não vai para o face por motivos de: vão me confundir com algum (...)

O Buda sobre como respirar para meditar


Foi o buda que incorporou a respiração dentro de um sistema com metodologia precisa para alcançar a cessação do sofrimento, e a combina com uma investigação intelectual (shamatha e vipassana). Hoje em dia se popularizou o que se conhece como mindfulness, que é uma adaptação da meditação budista - principalmente da atenção consciente, do cultivo do samadhi -  a um contexto secular.

Plavras-chave: respiração, meditação, samadhi e vipassana

Um esquema avançado de meditação analítica que se deriva primeiro da observação da respiração e depois, com grande naturalidade, de uma série de intuições ou descobrimentos que nascem ao dirigirmos esta mesma atenção plena, livre de conceitos e obscurecimentos, à própria mente. De certa forma, a calma mental (o samadhi) ao se produzir naturalmente, gera uma lúcida introspeção (o insight ou vipassana); ou, em outras palavras, se alguém aprende a respirar, de maneira natural a respiração pouco a pouco nos irá levando à sabedoria (o prana, ar e energia são afinal de contas a mesma consciência). Se em contexto secular esta meditação é utilizada somente para acalmar a mente ou facilitar a concentração, se elevada a sua última consequência, contém a base para alcançar a sabedoria, que é sempre experiência direta e não intelectualidade abstrata.

O Buda ensina que quando a atenção plena à respiração é praticada adequadamente e se utiliza um método de interrogação a partir da observação, não deturpada por conceitos, prejuízos ou hábitos que escurecem a cognição, então surgem os sete fatores da iluminação, de maneira progressiva: sati (mindfulness), dhamma vicaya (análise ou investigação), viriya (energia ou persistência), pīti (a felicidade ou o prazer associados à calma), passadhi (serenidade ou tranquilidade), samadhi  e finalmente upekkhã (equanimidade). Esta é a transformação que atravessa a mente através da disciplina meditativa.

O último é a equanimidade, a qual fala de uma sabedoria, fruto da experiência da impermanência através da observação do corpo e dos fenômenos: como a natureza de todos os fenômenos é impermanente, não há verdadeira motivação para reagir a eles ou perseguir as sensações que eles nos causam, o que nos livra do sofrimento da avidez, do apago, da aversão, etc). 

(De fato se assemelha ao que Anton Lavey comenta na bíblia satânica: monges que sentam sobre os próprios joelhos o dia inteiro, a não fazer nada além de comer arroz. Entretanto não vou querer compreender com este tom, porque sei do que se trata este ponto budista: a vacuidade original que é potência para a criação, o que a Física Quântica confirma, e que além do mais é um baita sedativo para as emoções. A vida é um sonho!)

A objetividade do método budista: uma ciência neutra para estudar a mente. Então se fulaninho não acredita em Deus, mas também não pratica meditação, então é apenas um ignorante. Não há como observar as crateras da Lua sem um microscópio; o cientista tem seu equipamento...


É aqui que se revela uma "ciência budista" ou uma ciência contemplativa; o que permite fazer tais experimentos, que são ao mesmo tempo um entretenimento, é que a mente se encontra em calma (isto é equivalente à objetividade dentro do método científico). Nestes procedimentos são revelados os princípios da filosofia budista - como a impermanência ou transitoriedade - dentro do experimento que é a meditação, para que possam ser observados de maneira conclusiva no próprio organismo, e não sejam somente um ensinamento que o adepto escuta, sem que se convertam em verdades da própria experiência.

As quatro aplicações do mindfulness são: primeiro a contemplação do corpo ( a observação dos elementos do corpo, a postura e as sensações puramente físicas da respiração); segundo a contemplação dos sentimentos (as sensações que ocorrem no corpo, sejam de prazer, dor e demais que são observadas sem identificação); terceiro, a observação da mente (esta é a observação da atividade mental, emoções e pensamentos e a consciência que se observa a si mesma) e quarto, a contemplação dos dharmas ou objetos mentais (aqui se observam distintos estados mentais, como os cinco obstáculos, os cinco agregados, os sete fatores da iluminação e as quatro nobre verdades. Sempre com base na respiração.

Traduzido e adaptado de: http://pijamasurf.com/2016/11/el_buda_sobre_como_respirar_para_meditar/

Desconstruindo a ilusão de que somos egos e de que existimos separados

Um dos ensinamentos centrais do budismo é que o eu individual que aparece a nós tão sólido e estável não existe por conta própria na realidade, e sim que emerge com nossos pensamentos, conceitos e relações. Como tal, não pode encontrar-se em nenhum lugar específico e só se mantém enquanto reificamos conceitos de ser tal pessoa, com estas ou aquelas características.

Palavras-chave: budismo, vacuidade, psicologia, ego, holístico, conexão.

O limite do corpo humano é a pele?

A palavra indivíduo significa "indivisível", mas não há nada em nós que nos seja indivisível: nosso corpo está formado por uma pele e órgãos que por sua vez estão formados por tecidos, que estão formados por moléculas que estão formadas por átomos... Mas os átomos, segundo a física moderna, não são realmente coisas, são ondas de informação que surgem e desaparecem. Agora bem, se a isto respondermos que não estamos em nenhuma parte em específico além mesmo da totalidade do nosso corpo, então surge a pergunta de até onde chega nosso corpo, já que nossa pele é permeável e estamos constantemente sendo penetrados por milhões de microrganismos, pela luz do sol e diferentes ondas de espectro eletromagnético; mesmo assim estamos respirando e recebendo do ambiente numerosas influências sutis. Assim, nosso corpo não é muito estável, não tem limites definidos que podem fixar nossa identidade. Podemos dizer então que na realidade somos nossa mente, mas onde está nossa mente? Segundo o mestre Tsoknyi Rinpoche:

Não há um lugar a partir do qual a essência da mente provenha ou surja, não há um lugar aonde vai ou onde desapareça, e não há um lugar onde agora mesmo se encontre. Ainda assim, está presente em todas as partes, de uma maneira que a tudo penetra. Assim sua essência é a vacuidade. (Vacuidade como princípio de potência criadora. Lembrar da espuma quântica.)
O ego é construído pelo diálogo interno e pelos rótulos que recebemos.

James Low observa que a mente é como o espaço, uma conhecida metáfora do budismo tibetano. Como o espaço, é algo que não se pode agarrar, não é uma coisa; é de onde surgem os fenômenos, é potência ilimitada (somos espaço que sonha com ser sólido). O ego tampouco é uma coisa, mas ao nos apegarmos a ele, ao crer que é uma coisa, surge uma sensação aparente de solidez - o que para os tibetanos é um predomínio do elemento terra. Temos, ao nos apegarmos reiteradamente a esta noção (a esta tensão) de ser um eu individual, a ilusão da durabilidade, sustentação e previsão. Isto de certa maneira nos dá segurança, mas por outro lado nos limita e nos faz rígidos. Ao sermos sólidos e termos uma identidade definida, as coisas podem nos atingir: qualquer sucesso que nos ocorra nos marca, qualquer carapuça que nos empregam, nós usamos. Se fôssemos como o espaço, nada permaneceria, da mesma maneira que a ave não deixa rastros no céu. Ao nos concebermos sólidos, independentes, separados, como objetos rígidos, como o elemento terra, trancamo-nos no nosso próprio mundo; concretizando a fantasia de nossa descrição do mundo, do nosso diálogo interno, de existir separados diante de uma infinidade de objetos constantemente a mudar, que determina nosso prazer ou dor.

Temos de viver com a pesada responsabilidade de administrar nossa própria personalidade. Cuidar do nosso prestígio, da opinião que acreditamos que as outras pessoas fazem da gente, e também temos de administrar e reforçar os conceitos que temos de nós mesmos, e não só os positivos, mas também os negativos. Chegamos então a existir como sujeitos e objetos, os dois ao mesmo tempo fragmentados - o sujeito que tem a experiência, e os objetos conceituais que temos criado, acreditando que somos de certa maneira, o qual evidentemente gera uma enorme preocupação e gasto de energia, já que temos que andar cuidando e dialogando com todos estes objetos que sustentamos com nossos pensamentos. O comentário interno que temos sobre nós mesmos é uma manifestação da nossa ansiedade quanto aos comentários que acreditamos que os outros fazem de nós mesmos e também dos comentários que fazemos sobre outras pessoas. Isto implica estarmos permanentemente confundindo o mapa com o território, já que sustentamos diálogos virtuais com pessoas que não estamos vendo e em situações que não estamos vivendo.

Nossa identidade surge com estes diálogos internos e da retroalimentação que temos com o mundo e com as demais pessoas. Está se recriando constantemente, em cada uma destas interações. Sugere-se que é por isso que nos assusta ficarmos sozinhos em algum lugar sem fazer nada. Isto nos coloca em uma crise de identidade. Pode ser uma oportunidade de observar nossa mente e entender como nossos pensamentos nos levam constantemente a nos identificar com objetos e conceitos, ou simplesmente nos colocarmos num estado de angústia porque não podemos nos retirar de nosso conteúdo mental ao nos projetar sobre um objeto familiar.

Traduzido e adaptado de: http://pijamasurf.com/2016/11/desconectados_la_interesante_tendencia_en_europa_de_abandonar_internet/

domingo, 20 de novembro de 2016

A carta que meu pai nunca me escreveu

Para estar contente, vai à feira aos Domingos. 

Toma cerveja no bar do português e conversa com ele sobre tua mocidade, e teu passado que ele sabe bem.
Enche teu copo para beber com os homens que saíram de seus lares pela manhã, e também bebem e conversam naturalmente - e aprende que voz e palavras com sentido que saem de suas bocas são tão naturais apenas quanto o próprio som que os pássaros piam.  (...) o homem atarracado, de barriga, que come ovo cozido.

Respira e ri com o português seu riso grasnado, mas não se apega à conversa, não leva a sério nem eles nem a Vida, pois assim como a conversa ao balcão, o Domingo também é um passatempo - passatempo dentro da Vida, o próprio passatempo de Deus que, querendo ser e existir, criou-nos com a mesma substância de seu pensamento.

Trabalha e goza, filho. Confia em quem te estende a mão, e fica seguro em ti mesmo. 
Desce à avenida e anda pelo calçadão entremeado de gentes, corpos de pele quente que se remexem e luzem sob o Sol que doura as frutas empilhadas, todas elas em todas as cores e sabores. Come pastel especial, robusto e nutritivo, come da boa comida e faz existir no teu corpo aquela opulência da virilidade que só os homens conhecem, e bota muita, muita pimenta, para te lembrares sempre de que a vida é intensa.

sábado, 19 de novembro de 2016

"Eu juro que não entendo pq vc fica se torturando assim, manda a msg e depois fica bolado"

 dedicado a mim mesmo e estimulado pela amiga Ana.
"Não tão complicado demais, mas nem tão simples assim"
É uma questão de expressão. Se sou todo sentimentos, a voz escrita comunicando com sinceridade o que sinto põe-me mais descoberto que uma fotografia de nudez. 

Mas por que me colocar assim tão vulnerável? É uma prática de autenticidade. Acredito que minha alma embruteceria se eu adotasse uma compostura de guardar meu coração num cofre, preservando-o intocável às emoções. Entrego-me porque estou aberto ao prazer e à dor.

Sou forte porque me amparo primeiramente no Deus do meu coração, meu Yoga e minha meditação. Depois, amizades e família me ajudam todos os dias a me levantar novamente. Com fé, persigo a coerência e estabilidade, e sem isto a vulnerabilidade intencional na qual me coloco seria apenas tolice.

O problema maior, Ana, é que eu tenho esta tendência a agradar - chamemos de excesso de benevolência ou complacência desmesurada. Como disse a pombo-gira do terreiro que você própria me levou "aí no seu coração cabe o mundo todo. Você tem que pensar em você mesmo, depois em você mesmo de novo, aí, em você, em você de novo, e daí nos outros".  Percebe?

Então quando eu digitei para você aquela mensagem que me expôs eu estava buscando o equilíbrio entre o que eu tenho que guardar para mim, e o que eu tenho que dizer para que meu corpo sentimental não sucumba! Uma manobra racional sobre emoções; não tão simples mas para a qual eu vou desenvolver discernimento.

O que me preocupa é a reação a ser desencadeada em você - porque não quero te entregar o que você não quer receber. Isto é compreensão, isto é amor. Não quero incidir neste erro - porque se não for para ser bem feito é melhor que eu nem comece. E aqui está a resposta de por que eu fico bolado! O motivo para você ficar ofendida seria eu, desmesurado de paixão, mandando mensagem para você, compromissada.

Sim, quando estou gostando de uma pessoa eu sou carente da opinião dela para corroborar minhas ações. Não tenho vergonha de admitir isso, pois é um elemento da minha personalidade que eu quero modificar. A longo prazo isso levaria à conclusão de que eu me abstenho de mim mesmo apenas para realizar a vontade da outra pessoa, o que desconfigura um relacionamento interpessoal e o rebaixa à qualidade de servidão.

Então, acho que você foi colocada na minha vida como amiga justamente para isso, para eu desenvolver esta economia de sentimentos, o que eu já buscava desde antes, e também como recomendou a pombo-gira "afeto quando é demais, sobra..." 

Aqui esta a resposta.  Um exercício de compreensão que eu tenho certeza vai ser ser positivo para nosso envolvimento.

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Para fins de justiça vou realizar um esforço e enunciar factos pelos quais devo gratidão:
  • a casa que me abriga consiste num lar respeitável cujos habitantes gozam de relativa boa saúde e não são aviltados por carências materiais;
  • em minha jornada identifiquei e produzi alterações em partes de mim que deveriam ser mudadas, a saber: 
  1. manias e tiques nervosos;
  2. pensamentos negativos que favoreciam a timidez e misantropia;
  3. pensamentos negativos que favoreciam uma atitude de desgosto com a sociedade de consumo;
  4. completa falta de traquejo em small talks;
  5. incapacidade de me amparar internamente quando em círculos sociais;
  6. necessidade cada vez mais candente de auto-expressão;
  7. carência por amizades femininas;
  8. abandonei o vício da pornografia e deixei de objetificar mulheres;
  9. abandonei o vicio do fone de ouvido que me aprisionava em minha mente e me alienava do ambiente externo da cidade;
  • nutro uma intensa curiosidade só equiparável à minha brilhante intelectualidade;
  • adquiri habilidade com a câmera fotográfica;
  • adquiri habilidade para falar, seja em rodas de conversa, sala de aula ou sozinho mesmo;
  • aprimorei habilidade com as palavras escritas;
  • tenho a disposição e disciplina necessárias para estudar e ser aprovado em concursos públicos;
  • busquei minha espiritualidade através do Yoga, da meditação Rosa Cruz e do Espiritismo;
  • consigo ser um sujeito amável e querido, a quem as pessoas querem estar próximas - o que, diga-se de passagem, deve ser agora trabalhado para que eu não me doe aos outros despercebida ou excessivamente;
Para que se goze, é imprescindível a movimentação do dinheiro, esta ferramenta reconhecida por impôr a vontade de um homem no mundo exterior, capaz de mudar o arranjo de pessoas ou objetos e por isso considerada por respeitáveis pensadores como instrumento conciliador da liberdade individual.
Mas quando se vive constrangido pelas estruturas de uma sociedade capitalista terceiro-mundista, o pior não é ter de converter as horas do meu próprio dia em um ordenado que baste para realização dos meus desejos, mas sim querer trabalhar e não encontrar patrão disposto a me submeter.

Sentindo-me seco, desorientado e humilhado eu escrevo sem amparo estas considerações ao entardecer, porque já não posso dormir mais. Diminuído, porque a expressão dos meus sentimentos é cotidianamente constrangida; e resignado, porque sinto ser esta a sina da minha alma sentimental. 

Sim, é assim. Já que minha timidez para a vida sempre me impediu de expressar no mundo a vontade do meu ego reprimido, eu assumi como única alternativa a nutrição da ficção e do sentimento. Ficção para histórias de amor, e sentimento como alternativa para conseguir, sem luxúria, o que a minha volúpia rala falhou em me conceder. (Não repugno a luxúria por fator moral, e sim porque não sei cumprir com seus desígnios). Mas o próprio sentimento me trai, pois a cada dia fica mais claro que a afecção, quando é muita, sobra.

Estas mãos que agora digitam são movimentadas por um espírito de tipo raro que nunca foi capaz de tocar a realidade nem sequer com a ponta dos dedos. Solícito e complacente, porque impotente e passivo. Nunca teve os culhões para tomar para si uma mulher, e se gozou, foi menos para se satisfazer a si próprio que para ser caridoso e realizar sua necessidade servil de agradar. 

Aqui jaz uma pessoa que participou da vida somente como intermédio, nunca como fim.

Não tenho tempo para escrever ficção, e se me absorvo perscrutando em palavras as chagas da minha maledicência é porque este é meu dever como ego. Se entretanto eu fosse mesmo guiado por forças da luz, e não por demônios corruptores, eu estaria escrevendo bens-dizeres sobre minha personalidade - atividade para a qual me falta o ímpeto ou amor próprio. Se eu fosse coerente com tudo o que aprendo de mais digno nas casas de espiritualidade, não me qualificaria pela negativa.

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

“Prece de Saint-Martin”

“Fonte eterna de tudo o que existe envia a este que te busca o espírito da verdade para que o aproxime para sempre de ti. Que o fogo desse espírito consuma até o último vestígio do velho homem, e, após tê-lo consumido, faze daquela massa de cinzas um novo homem, sobre o qual tua santa mão não desdenhe verter tua santa unção… Que a vida universalmente una transforme todo o meu ser na unidade de tua imagem, meu coração na unidade do teu amor, minha ação numa unidade de obras de justiça, e meu pensamento numa unidade de luzes… Sim, Deus de minha vida, só em ti posso encontrar a existência e o sentimento de meu ser. Graças te sejam dadas, Deus de paz e de amor! 
Louis-Claude de Saint-Martin.

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Yoga é divinatório porque atua, através do corpo físico, em outros níveis vibratórios, em conexão com o Espírito.

O corpo é a Realidade Una
O homem é constituído não só por "um corpo físico e uma alma imaterial", como se dizia antigamente. É um ente complexo. Participa de vários níveis vibratórios ou planos da existência universal. As práticas e a filosofia yoguis agem beneficamente sobre os nervos, sobre todos os órgãos, glândulas, finalmente sobre o todo orgânico, mas, indo além, harmoniza um outro nível imediato, conhecido como "corpo vital". Não se detém aí: alcança o "corpo astral". Chega ao "plano mental" e passa adiante, a níveis de ser ainda mais quintessenciados e cada vez mais próximos do Espírito. Yoga é o aperfeiçoamento de cada plano bem como a integração ou harmonização de todos eles, realizando a Unidade do homem.

domingo, 13 de novembro de 2016

Bem aventurados sejam os aflitos, pois a eles será dado o conhecimento.

 Ao Senhor Supremo, cuja forma é a encarnação da existência eterna, conhecimento, e bem-aventurança.
... e está revelando a aqueles que estão absorvidos em Seu conhecimento supremo, que ele é apenas conquistado por devotos cujo puro amor é impregnado por intimidade e é livre de todas as concepções de temor e reverência (="reverence"). Com grande amor eu novamente ofereço minhas reverências (="obeisances") ao Senhor Damodara centenas e centenas de vezes. 
Que esta bela visão de Sua face de lótus seja sempre manifesta em meu coração. Milhares e milhares de outras bênçãos são inúteis para mim.

Chaitanya Mahaprabhu exibindo sua Forma Universal a Advaita Acharya

Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura esforçou-se vigorosamente ao longo de sua vida para garantir que entendêssemos que a concepção artificial deles de dharma não é a concepção proposta por Sri Caitanya Mahaprabhu. Somente o empenho para espalhar de uma maneira simples os ensinamentos de Caitanya Mahaprabhu, estando cuidadosos para não os manipular nem levemente, será nosso único bhajana. Mas se uma pessoa espera até que se torne perfeita antes de disseminar aqueles ensinamentos, ela estará privada do serviço de ensinamento. Certamente, ela permanecerá naquele estado imaturo ao longo de toda sua vida.

Então, inspirado por Sri Mahaprabhu, Ramananda Raya falou a próxima verdade mais elevada: “krsne karmarpana – sarva-sadhya-sara - oferecer a Sri Krsna os resultados da ação de alguem é a essência de toda a perfeição." Embora oferecr os resultados das atividades de alguém desta maneira não seja o caminho para obter krsna-prema. Para transmitir isso, Mahaprabhu disse, "eho bahya, age kaha ara - isto é externo. Por favor conte-me um conceito mais alto que isso."

"Quando eu houver oferecido isso, o Senhor pode aceitá-lo. Se Ele pode aceitá-lo, isso só significa que ele pode comer enquanto também concede benção. Certamente, portanto, Ele não poderia estar desprovido de características."

O despertar deste tipo de entendimento invoca um humor (bhava) que pode resgatar alguém do controle da impessoalidade e ajuda-la a manter-se estável em uma concepção pessoal de Bhagavan. 

Sobre Baghavan - mais um conceito holístico (exraído do endereço http://www.yoga.pro.br/artigos/1076/3019/quem-e-bhagavan):

"'Total e absoluta suserania (soberania), aiśvarya , poder, vīra, abundância, śrī, desapego, vairāgya, fama, yaśas, e conhecimento, jñāna, são conhecidas como bhaga'.

Bhagavān é ilimitadamente poderoso, anantavīrya. Todos este cosmos, toda esta manifestação é prova de poder, śakti. O poder que deu origem à materia, o poder que existe para sustentar a matéria e o poder necessário à resolução. Bhagavān tem este poder levado ao infinito, ele mesmo é o infinito, ananta.

Bhagavān é fonte inesgotável de todos os recursos, de toda a abundância, de toda a riqueza, śrī. O homem durante o seu período de vida acumula bens materiais que ficam quando ele parte, quando morre. Na realidade toda abundância, śrī é Bhagavān. A água dos oceanos, o ar que respiramos, todos os seres vivos, o Sol, toda essa abundância de recursos é Bhagavān.

Bhagavān é também aquele a quem nenhuma lei se impõe, ele é o somatório de todas as leis, a causa de todas as leis, ele 'é' também na forma de leis. Bhagavān é o único senhor absoluto e detém a qualidade chamada aiśvarya, total soberania. Podemos dizer que é o grande Imperador. O ser humano que é dotado de grande inteligência, capacidade e meios para a usar, apenas pode usar as leis presentes na manifestação.

A engenharia é um exemplo desse uso,  a biologia é outro exemplo, a química mais um exemplo. Em todos estes exemplos, nunca o homem foi o criador de uma sequer lei, descobriu-as mas não as criou. Usa-as mas não as modifica. Equaciona-as mas não as transforma. Aquele que tem o controlo absoluto é Bhagavān."

Sobre a natureza tatashta das almas (="energia marginal da qual é feita as almas individuais")

No Hinduísmo taṭasthā-śakti é energia espiritual de Deus, mas marginal, e seres vivos (Jiva, Atmas) têm alguma relação com esta energia. Embora eles sejam eternos, a posição deles é de energia marginal - entre baixa energia material e alta energia espiritual. Em outras palavras, taṭasthā-śakti está entre energia externa (material) e energia interna (também eterna e espiritual) de Krishna Svayam Bhagavan. Em Caitanya Caritamrta, Madhya, verso 6.160 estão enumerados estas três energias:

A potência espiritual da Suprema Personalidade da cabeça de Deus também aparece em três fases - interna, marginal e externa.

Outro verso (Caitanya Caritamrta, Madhya, 8.152) fornece mais informação:

Em outras palavras, estas são todas potências de Deus - interna, externa e marginal. Mas a potência interna é a energia pessoal do Senhor e prevalece sobre as outras duas.

Então jivatma (seres vivos) nunca são iguais à Suprema Cabeça de Deus, e estão sempre subordinados a Ele. Acima de tatastha shakti está a energia Interna de Krishna.

Preceitos elaborados por Caitanya Mahaprabhu para conduzir ao amor a Sri Krsna e obter prema-bhakti:

Krishna é a Verdade Absoluta Suprema;
Krishna é dotado de todas as energias;
Krishna é o oceano de rasa (teologia);?
As jivas (almas individuais) são todas partes separadas do Senhor;
Em estado vinculado, as almas estão sobre influência da matéria devido à sua natureza tatashta.
Em estado liberto, as almas são libertas da influência da matéria, devido à sua natureza tatashta.
As jivas e o mundo material são ambos diferentes e idênticos ao Senhor.
Devoção pura é a prática das jivas.
Amor puro de Krishna é o objetivo último.
Krishna é a única bênção amável a ser recebida.

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Sobre platonismo e razão pura: conceitos de amor e beleza

"Devemos ascender do corpo à alma, da alma ao anjo, e do anjo a Deus. E em sentido inverso, é assim que a beleza entra no mundo e se transforma em amor: partindo de Deus, é chamada beleza; ao passar ao mundo e extasiá-lo, é chamada amor; e uma vez que retorna ao seu Autor, a ele enlaça em sua obra, é chamada deleite. É importante mencionar que os filósofos platônicos criaram uma equação entre verdade, bondade, beleza e amor, elementos geralmente intercambiáveis em uma escala harmônica do mundo. Mais tarde o poeta Keats, em um eco platônico, diria 'beleza é verdade; verdade, beleza.'"

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

apenas um sonho

Sonhei com a Ana. Estávamos nos pegando em todas as situações imagináveis. Numa festa à fantasia, ela vestindo um top que deixava um pouco da barriguinha à mostra. Minhas mãos na cintura dela (...). No jardim multicolorido de um oásis campestre, nossos cabelos catavam a brisa fresca da nuvem púrpura que nos envolvia. Debaixo da escada, dois corpos reconheceram-se na carne, enquanto bocas aproximadas exalaram o bafejo quente de almas que se expandiam. No pátio, alunos do John extasiados em pândega irrefreável durante performances catárticas. Os fogos de artifício estouravam rubimente em fagulhas nítidas no céu entalhado pelas estrelas infinitas. Sorrisos, abraços, chamego e gracejos sob as nuvens baixas de um céu saboroso como todas as cores de todas as frutas.

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muito adjetivado, muito palavroso.menos deveria ser mais.

terça-feira, 8 de novembro de 2016

As quatro qualidade do amor verdadeiro, segundo Thich Nhat Hanh



Introdução

"O que posso fazer para me certificar de que estarei com Brahma depois que eu morrer?" e o Buda respondeu, "Já que Brahma é a fonte do Amor, para habitar com ele você deve praticar o Brahmaviharas-amor, compaixão, alegria e equanimidade."

Vihara é uma abóboda ou uma habitação. Amor em sânscrito é maitri; em Pali é metta. Compaixão é karuna em ambos os idiomas. Alegria é mudita. Equanimidade é upeksha em sânscrito e upekkha em Pali. Os Brahmaviharas são os quatro elementos do amor verdadeiro. Eles são ditos "imensuráveis" porque se você os pratica, eles crescerão em você a cada dia e abrangerão o mundo inteiro. Você se tornará mais feliz, e todas as pessoas ao seu lado também se tornarão mais felizes.

Se nós aprendermos caminhos para praticar o amor, compaixão, alegria e equanimidade, saberemos como curar as doenças da raiva, mágoa (="sorrow"), insegurança, tristeza (="sadness"), ódio, solidão e apegos doentios. Amor, compaixão, alegria e equanimidade são a própria natureza de uma pessoa iluminada. Eles são os quatro aspectos do amor verdadeiro dentro de nosso próprio self, dentro de todas as pessoas e todas as coisas.

Amor (Maitri/Metta)

O primeiro aspecto do amor verdadeiro é maitri, a intenção e capacidade de oferecer alegria e felicidade. Para desenvolver esta capacidade, nós temos que praticar o olhar e a audição profundos para que saibamos o que fazer e o que não fazer para fazer os outros felizes. Se você oferecer à sua amada alguma coisa que ela não precisa, isto não é maitri. Você deve observar a real situação dela, ou então você pode oferecer algo que possa trazer a ela a infelicidade.

Sem compreensão, seu amor não é amor verdadeiro. Você deve olhar profundamente para ver e entender as necessidades, aspirações e sofrimentos daquele que você ama. Nós todos precisamos de amor. Amor nos traz alegria e bem-estar. É tão natural quanto o ar. Nós somos amados pelo ar, nós precisamos de ar para estarmos felizes e bem. Nós somos amados pelas árvores. Nós precisamos de árvores para sermos saudáveis. Para sermos amados, nós temos de amar, o que significa que temos de entender. Para que o nosso amor continue, nós temos que realizar a ação ou não-ação apropriadas para proteger o ar, as árvores e a nossa amada.

Maitri pode ser traduzida como amor ou bondade amorosa. Alguns mestres budistas preferem "bondade amorosa" pois acham a palavra "amor" muito perigosa. Mas eu prefiro a palavra "amor". Palavras às vezes ficam doentes e nós temos que as curar. Nós temos usado a palavra "amor" para significar apetite ou desejo, como em "Eu amo hambúrguer." Nós temos que usar a linguagem mais cuidadosamente. "Amor" é uma bela palavra; nós temos que restaurar o seu significado. A palavra "maitri" tem raízes na palavra "mitra", que significa amigo. No budismo, o principal significado de amor é amizade.

Nós todos temos sementes do amor em nos. Nós podemos desenvolver esta maravilhosa fonte de energia, nutrindo o amor incondicional que não espera nada em retorno. Quando entendemos profundamente alguém, mesmo alguém que nos causou dano, nós não podemos resistir a lhe amar. O Buda Shakyamuni declarou que o Buda do próximo eon será nomeado "Maitreya, o Buda do Amor."

Compaixão (Karuna)

O segundo aspecto do amor é karuna, a intenção e capacidade de aliviar e transformar o sofrimento para aliviar a mágoa. Karuna é usualmente traduzida como "compaixão" mas isto não é exatamente correto. "Compaixão" é composta de com ("junto com") e paixão ("sofrer"). Mas nós não precisamos sofrer para remover o sofrimento de outra pessoa.

Para desenvolver compaixão em nós mesmos, temos de praticar a respiração auto-consciente, audição e visão profundas. O Sutra Lótus descreve Avalokiteshvara como o bodhisattva que pratica "olhando com os olhos da compaixão e ouvindo profundamente os suspiros do mundo." Compaixão contém preocupação profunda. Você reconhece que uma pessoa está sofrendo, então você se senta próximo a ela. Você a olha e a ouve atentamente para estar capacitado a tocar a dor dela. Vocês estão em profunda comunicação, comunhão com ela, e isso sozinho traz algum alívio.

Palavras, ações ou pensamentos compassivos podem reduzir o sofrimento de outra pessoa e trazer alegria a ela. Uma palavra pode oferecer conforto e fé, destruir a dúvida, ajudar alguém a evitar um erro, reconciliar um conflito, ou abrir a porta para a liberação. Uma ação pode salvar a vida de uma pessoa ou ajudá-la a tomar vantagem de uma oportunidade rara. Um pensamento pode causar o mesmo, porque pensamentos sempre levam a palavras e ações. Com compaixão em nosso coração, todo pensamento, palavra e ato pode produzir um milagre.

Quando eu era aprendiz, não conseguia entender por que, se o mundo está preenchido de sofrimento, o Buda tem tal sorriso bonito. Por que não está ele perturbado pelo sofrimento? Depois eu descobri que o Buda tem compreensão suficiente, calma e força; é por isso que o sofrimento não o oprime. Ele é capaz de sorrir ao sofrimento porque sabe como lidar como lidar com isso e como transformá-lo. Nós devemos estar atentos ao sofrimento, mas reter nossa clareza, calma e força para que nós possamos transformar a situação. O oceano de lágrimas não pode nos afogar se karuna está conosco. É por isso que o sorriso do Buda é possível.

Alegria (Mudita)

O terceiro elemento do amor verdadeiro é mudita, alegria. Amor verdadeiro sempre traz felicidade para nós mesmos e para aquele que amamos. Se nosso amor não traz alegria para nós dois, não é amor verdadeiro. Comentadores explicam que a felicidade relaciona-se duplamente a corpo e mente, enquanto alegria relaciona-se primeiramente à mente.

Esse exemplo é frequentemente dado: alguém está viajando pelo deserto e vê um córrego com água fresca e experimenta a alegria. Ao beber a água, ele experimenta a felicidade. Ditthadhamma sukhaviari significa "alegremente habitar no momento presente." Nós não nos apressamos para o futuro; nós sabemos que tudo está aqui no momento presente.

Muitas pequenas coisas podem nos trazer tremenda alegria, como a consciência de que temos os olhos em boa condição. Nós abrimos nossos olhos e podemos ver o céu azul, as flores violetas, as crianças, as árvores, e muitos outros tipos de formas e cores. Habitando em atenção plena, nós podemos tocar estas maravilhosas e refrescantes coisas, e nossa mente de alegria emerge naturalmente. Alegria contém felicidade e felicidade contém alegria.

Equanimidade (Upeksha)

O quarto elemento do amor verdadeiro é upeksha, que significa equanimidade, tranquilidade, desapego e capacidade de libertar. Upa significa "acima", e iksha significa "olhar". Se seu amor tem apego, distinção, preconceito ou apego, não e amor verdadeiro.

Pessoas que não entendem o Budismo às vezes pensam que upeksha significa indiferença, mas a verdadeira equanimidade não é fria nem indiferente. 

Upeksha tem a marca chamada samatajñana, "a sabedoria da igualdade", a habilidade de ver todos como iguais, sem discriminação entre nós e os outros. Em um conflito, mesmo que estejamos profundamente preocupados, nós nos mantemos imparciais, habilitados a amar e entender ambos os lados. Livramo-nos de toda discriminação e preconceito, e removemos todas as fronteiras entre nós mesmos e os outros.

Enquanto vermos nós mesmos como aqueles que amam e os outros como os que são amados, enquanto nos valorarmos mais do que os outros ou vermos nós mesmos como diferentes dos outros, nós não alcançaremos a verdadeira equanimidade.  Nós temos que nos colocar "por debaixo da pele da outra pessoa" e nos tornarmos um com ela se desejarmos entender e realmente a amar.  Quando isto acontece, não há self nem tampouco outro.

Sem upeksha, seu amor pode tornar-se possessivo. Uma brisa de verão pode ser muito refrescante, mas se tentarmos colocá-la numa lata para que possamos tê-la inteiramente para nós, a brisa morrerá. Nosso amado é o mesmo. Ele é como uma nuvem, uma brisa, uma flor. Se você o aprisiona numa lata, ele morrerá. Ainda assim, muitas pessoas fazem exatamente isso. Eles roubam seus amados de sua liberdade, até que ele não possa mais ser ele mesmo. Eles vivem para a auto-satisfação e usam os seus amados para ajudar a cumprir este desejo. Isto não é amor, é destruição.

Você diz que o ama, mas não entende suas aspirações, suas necessidades, suas dificuldades, ele está numa prisão chamada amor. Amor verdadeiro permite que você preserve sua liberdade e a liberdade de seu amado. Isto é upeksha.

Para o amor ser amor verdadeiro, deve conter compaixão, alegria e equanimidade. Para a compaixão ser compaixão verdadeira, deve conter amor, alegria e equanimidade. Alegria verdadeira deve conter amor, compaixão e equanimidade. E equanimidade verdadeira deve ter amor, compaixão e alegria.

Nós devemos olhar profundamente e praticar estas quatro aspectos para trazermos o amor verdadeiro em nossas vidas e nas vidas e quem amamos.

Traduzido e adaptado de: https://creativesystemsthinking.wordpress.com/2015/02/15/the-four-qualities-of-love-by-thich-nhat-hanh/



sábado, 5 de novembro de 2016

Eu disse Aleluia!

"Isso porque essa paixão passou e você não tem mais sentimentos pela pessoa que te afetava emocionalmente outrora. Rá! Esse é o pulo do gato, essa garota pela qual está apaixonado agora é exatamente como as anteriores, a diferença é que sua emoção está concentrada nela, assim analisando de forma lógica o que você sente por essa mulher nesse momento não é porque ela é única ou algo do tipo, mas simplesmente um sentimento momentâneo.

A paixão é uma patologia

É meu amigo, por essa você não esperava. A paixão é um sentimento considerado muito próximo a uma doença. É definida assim porque o individuo perde parcialmente a sua individualidade, identidade e o poder de raciocínio."

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

fragmento a concluir

Fotografia cósmica
Céu da tarde sobre a periferia paulistana.
Em algum bairro longínquo, para além da última estação do metro de certa comarca desconhecida, e lotação adentro por vias impossíveis, reproduz-se exatamente a vida certa aqui.
No ritmar de passos naturais pela calçada do sempre seguir em frente, corpos eretos sobre o solo vão às compras, e acima brilha majestosamente o Sol a fulgurar estes desassistidos casebres caramelo de tijolo baiano.
Daqui de cima, tudo é laje e roupas ao varal. Sinto alegria quando ouço o vizinho urrar em êxtase ufano, alto sobre a laje do casebre todo seu, onde habitam mulher e filho repousados.

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estes fragmento tem um super potencial.


Agora eu não estou aqui.

Fecho os olhos e abraço o planeta Terra.
Sou o puro espaço.
Sou o Sol,
a vasta terra a nutrir imensos e úmidos campos verdes,
a água que corre cristalina como espelho translúcido,
sou o calor de todos os corações pulsando ao mesmo tempo.
Sou o vapor sutil que se levanta e conduz o perfume das flores.
Não sou eu. Apenas sou.
Sou você.
O ar infinitamente em movimento a transmitir os sons das buzinas e o ronco dos motores na cidade que funciona como máquina. Sou todos os corpos eretos sobre o solo.
Sou a célula de uma bactéria no estômago de toda a população mundial. Sou um bilhão de ecossistemas microscópicos.
Sou todos os fenômenos biológicos.

Sou uma fotografia cósmica, e o tempo para mim não existe.

Eu sou, mas sou sozinho, no meu quarto numa madrugada intelectual. Sou agora.
Dormir seria perder tudo isto, e amanhã quando tu me vires no teatro de caras e bocas e palavras, pergunta-me o que tomei de café da manhã.
Eu te amo.

Sou a febre.
Sinfonia do Desalento

É este o momento da noite em que eu declaro a neutralidade de todas as sensações: a depressão me satisfaz tanto quanto a realidade mais sublime.

Não há nada a ser buscado lá fora.
... pulsantes, queimam as palavras não ditas de todas as paixões,
e eu não seria ninguém sem minhas amizades.

Vendi meu amor para comprar uma rocha negra mais um punhado de carvão.

Por qualquer lugar que eu ande, ainda não encontrei nenhum inimigo tão elevado quanto o próprio medo; mas como um homem eu prefiro admitir o susto e sofrer o baque com lucidez, a enganar a mim próprio sem reconhecer (...).

O ritmo da respiração confere sabor autêntico a qualquer situação, embora a esperança esteja sempre arqueada sobre as asas de um desejo...

Quem passa a madrugada em claro, escrevendo, abdica da vida pelo sonho - mas nunca dormirá. Escrever é fixar sensações num papel, e se os pensamentos fluem pelo leito da mente desimpedidos, um arco-íris forma-se na queda d'água.

Pobres diabos de caráter rasteiro!, reféns das energias as mais primitivas, elevam o olhar franzido para o céu e se entregam aos hábitos mais básicos, presos por ondas de libido a corpos feitos para as sensações.

Aperte o botão - receba um orgasmo.
O pavor reclama,
vazios de propriedade, corpos entrelaçados transpiram as últimas mágoas da ilusão.
Quem sou eu, que nunca sei? O que sei eu, que nunca sou...?

Há uma distinção entre estimar e pagar pau, mas este talento que tem o poeta para transpor em palavras o âmago do seu íntimo não serve senão às estrelas...
A jóia muito brilhante ofuscou os olhos do próprio ourives.

Lá fora, o latido dos cachorros; e chega do céu um ruído onipresente. O vulto negro encobre a Lua.

Não há mais cavalos brancos para você montar, e toda a mentira anda de mãos dadas com justiça.

... na chaga da imperfeição o pus fermenta, fétido.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Princípios divinatórios da yoga

O ascetismo indiano impunha a relação do eu com o si-próprio, em um esforço místico de aproximar o ser humano a Deus. 

A yoga era praticada desde a proto-história indiana, e seus ensinamentos eram mantidos por um antigo colégio de sábios videntes. Através de práticas de ascetismo, o yogue reconhece a sublime interdependência entre o eu-autônomo e a consciência divina. Intensificada esta sensação de interdependência, a ilusão egoísta do eu-autônomo é desfeita, dando lugar à noção de criatura passa a ser emerge na consciência do yogue.

A noção de criatura é holística à medida que conecta o ser humano a uma Inteligência e Sabedoria superiores, como elemento menor de um grande arranjo ou desenho cósmico. A sociedade deixa de aparecer como um fenômeno a serviço do indivíduo.

O asceta reconhece que as todas as circunstâncias e condições de sua vida presente são resultado de decisões e escolhas realizadas previamente. Este princípio ativo-reativo, também conhecido como a Lei do Karma, explica as discrepâncias entre talentos individuais e coloca o indivíduo como responsável por seu destino à medida que é livre para exercer em ação a sua vontade. A análise profunda de causas e consequências revela-se coerente também ao nível do pensamento, pois é através de energias psíquicas positivas que a mente humana estabelece uma realidade própria que seja satisfatória.

A cosmogênese de uma sociedade holística geralmente estabelece que os seres vivos sejam realizados por graça divina. A dieta que assassina um exemplar vivo do princípio anímico universal, quando em consubstanciação no corpo humano, é causa de desequilíbrios. Este o princípio de ãhimsa - ou princípio da não-violência estabelece que o ser humano, ao se alimentar de ser vivo assassinado, está assassinando a uma fragmento diminuto, mas da mesma substância de Deus; e além disso, quando seu alimento vegetal não é consubstanciado em oferenda, então é como se estivesse roubando ao próprio Deus.

Com a chegada da cultura Ariana à Índia, no entanto, a presença de sacerdotes brâmanes colaborou para hierarquizar sectariamente a conexão do ser humano a Deus. A prática do eu-asceta foi substituída pela conformação do eu-ritual, encontrado nas mesas sacrificiais onde o sacerdote intermediava o contato entre Deus e ser-humano. 

A possessão divina encontrada no próprio corpo e na consciência do asceta, através de uma busca mística interior, foi substituída pela cerimônia ritual, que transmuta a relação indivíduo-Deus para uma atualização do contexto temporal. O objetivo da cerimônia sacrificial realizada pelo sacerdote era produzir alteração no conteúdo religioso do tempo, estimulando prosperidade, prudência, etc dentro do tempo cotidiano, e renovando a vida sobre a morte.

Se na sociedade holística o potencial divinatório é localizado no conjunto corpo-alma, que deve ser trabalhado em conexão com os auspiciosos objetivos da intencionalidade divina, na sociedade védica o sagrado é verificado não no corpo mas sim no próprio sistema hierárquico de castas, o qual tem na figura do sacerdote um pólo emanador de bênçãos contextualmente orientadas.

Vemos portanto como o asceta, sendo um indivíduo renunciador por excelência, consegue intensificar o sentimento de dependência existente entre a Consciência Divina e o Eu-Interior humano, estabelecendo a noção de criatura, que num processo de identificação mística produz a sacralização do ser humano em seu próprio corpo.  

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

"Ele viera ensinar aos homens que a verdadeira vida não é a que transcorre na Terra, e sim a que é vivida no Reino dos Céus; viera ensinar-lhes o caminho que a esse reino conduz, os meios de eles se reconciliarem com Deus e de pressentirem esses meios na marcha das coisas por vir, para a realização dos destinos humanos." O Evangelho Segundo o Espiritismo

Esta descrição nos informa sobre a trajetória de vida realizada por seres humanos Escolhidos, que têm como missão a transmissão de um conhecimento que aponta para a transcendentalidade da alma e superação da matéria, numa trajetória de vida que comumente registra uma série de provações morais. Isso se considerarmos apenas a mitologia judaico-cristã.   

domingo, 30 de outubro de 2016

trechos do conto "O professor de letras" (1894) de Anton Tchekov

[...]

E ele mirava o corpo pequeno e esbelto da moça sentada sobre o garboso animal branco, a sua silhueta esguia, o seu chapéu alto, que não lhe caía nada bem e a envelhecia, Nikítin mirava com satisfação, com ternura, com encantamento, ouvia sem entender muito bem e pensava: "Dou minha palavra de honra, juro por Deus que não vou ficar acanhado e hoje mesmo vou me declarar a ela...".

[...]

Sua carta começaria assim: "Minha querida ratinha...".
- Exatamente assim, "minha querida ratinha" - disse ele, e começou a rir.

[...]

"Após o casamento, todos se aglomeraram em desordem em torno de mim e de Mánia, as pessoas expressavam seu contentamento sincero, davam os parabéns, desejavam felicidades. O general de brigada, um senhor de quase 70 anos, cumprimentou apenas Maniússia e lhe disse, com voz envelhecida, rangente e bem alta, que ecoou por toda a igreja:
"- Minha querida, espero que depois do casamento você permaneça a mesma rosa que é agora."

[...]

Os dias mais felizes para Nikítin eram agora os domingos e os feriados, quando ele, da manhã à noite, ficava em casa. Nesses dias Nikítin tomava parte de uma vida ingênuo, mas extraordinariamente agradável, que lhe fazia lembrar os idílios pastorais. Observava sem cessar como sua Mánia, sensata e diligente, mantinha em ordem o lar, e ele mesmo, a fim de mostrar que não era supérfluo na casa, fazia alguma coisa inútil, por exemplo, rolava a charrete para fora do telheiro e a examinava minuciosamente. Às vezes, de brincadeira, Nikítin lhe guardava um corpo de leite; ela se assustava, pois seria algo irregular, mas ele, com um sorriso, a abraçava a dizer:

- "Pronto, pronto, eu estava só brincando, meu tesouro! Foi só brincadeira!"

[..]

Nikítin se deu conta de que, se os 12 rublos não lhe importavam, era porque não haviam custado nada a ele. Se fosse um trabalhador pobre, saberia o valor de cada copeque e não mostraria indiferença ao que ganhava ou perdia no jogo. Assim também a felicidade, raciocinou, lhe fora dada de graça, em troca de nada e, a rigor, era para ele um luxo tão grande quanto um remédio para alguém que não está doente; se ele, como a imensa maioria das pessoas, vivesse atormentado pela preocupação de ganhar o pão de cada dia, se tivesse de lutar pela vida, se as costas e o peito doessem de tanto trabalhar, esse jantar, essa residência aquecida e confortável e essa felicidade familiar seriam uma necessidade, o prêmio e o ornamento de sua vida; agora, havia nisso tudo um sentido estranho e obscuro.

- Puxa, como me sinto mal! - repetiu, compreendendo perfeitamente que esses pensamentos, por si só, já representavam um mau sinal.

[...]

Nikítin deu-se conta de que sua felicidade terminara, provavelmente para sempre, e que, na casa de dois andares, sem estuque, a felicidade já era algo impossível. Nikítin pressentiu que a ilusão se havia exaurido e que havia começado uma vida nova, nervosa e consciente, a qual não se conformava com a paz e a felicidade pessoal.

No dia seguinte, domingo, foi à igreja da escola e se encontrou com o diretor e os colegas. Pareceu a Nikítin que todos só se ocupavam em dissimular cuidadosamente a ignorância e o descontentamento com a vida, e ele mesmo, para que não notassem sua inquietação, sorria com toda simpatia e falava futilidades. Depois, foi para a estação e viu um trem postal chegar e partir; foi agradável ficar sozinho e  não ter de conversar com ninguém.

[...]

e escreveu no seu diário: "Aonde eu vim parar, meu Deus? Estou cercado de vulgaridade por todos os lados. Gente enfadonha, vazia, potes de cerâmica com creme azedo, jarras com leite, baratas, mulheres tolas... Não há nada mais medonho, mais ultrajante, mais deprimente do que a vulgaridade. Fugir daqui, fugir hoje mesmo, senão vou ficar louco!".


"mano, resumi um conto de várias páginas em alguns trechos. dá uma estima. daquele livro de capa roxa que caiu na tua mão!!"

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

[1915]

"O entusiasmo é uma grosseria.

A expressão do entusiasmo é, mais do que tudo, uma violação dos direitos da nossa insinceridade.
     Nunca sabemos quando somos sinceros. Talvez nunca o sejamos. E mesmo que sejamos sinceros hoje, amanhã poderemos sê-lo por coisa contrária.

Por mim não tive convicções. Tive sempre impressões. Nunca poderia odiar uma terra em que houvesse visto um poente escandaloso.

Exteriorizar impressões é mais persuadirmo-nos de que as temos do que termo-las."

domingo, 16 de outubro de 2016

Cultivando bons pensamento; na dúvida: cante santos nomes!

minha prudencia constante só é indício de que meu respeito e reverencia sao verdadeiros, e de que eu nao levo radha como garantida. a unica coisa que mudou é que agora eu sei que ela me quer. e eu sei mesmo. ela confirmou ao me beijar e depois ao perguntar "pq eu nao te veria?".

assim eu nao deixo a peteca cair e com prudencia amanha vou procura-la, com possibilidade dar a tortinha que ela gosta :)

Texto muito claro e de caráter terapêutico

eu reprimo meus sentimentos por medo de rejeição, e isso tem a ver com minha tendência a esquecer de mim e me doar demais pros outros. "doar" pq eu sempre quero criar uma situação idealmente perfeita e me esforço para tanto. e isso é um traste tambem pq eu me machuco muito facilmente quando as coisas acontecem e eu comparo/julgo. tanto é que eu tenho medo de arriscar e por isso surge minha hidra mental que impede a ação; e dai qnd eu arrisco eu fico extremamente vulneravel a altos e baixos - tudo ou nada, ser ou nao ser.

mas eu sei que isto tambem passa, e eu vou na psicologia da usp quarta feira para apresentar estas queixas.

eu, criança, entrego tudo isso a jesus e confio. quero me limpar disso que eu sinto e que nao é nada mais que minha raiz de sofrimento supondo desalinho com a realidade.
mas tudo isso nao é futil pq faz parte do meu darma: afinal eu estou na faculdade, descobrindo a mim e aos outros tambem. meu dom: comunicação, meu fardo: nao deixar minha pessoa implodir por excesso de empatia ( o que na verdade aponta para a tendencia de me importar com a opiniao dos outros para aprovação). tudo isso nao significa nada alem de que "eu estou no caminho certo", e confirma de bandeja que este nao é o caminho mais facil.

agradeço à ana pelos jantares e almocos mais apaixonantes de 2016 ate agora. "you're everything" return to forever na voz de flora purim.

eu quero olhar para as ruas e ver a alegria das coisas.
Quando fumo maconha eu fico tremendo, com a mente vacilando, e me isolo. Fico ruminando no pensamento tudo que já se passou, e planejando a temer tudo o que virá. 

Por que é que eu fumo maconha mesmo? 

Eu fumo maconha por cultura geral, e por algum efeito tênue que me envolve ao final da brisa.

O grande desnorteador verde.

Após os primeiros tragos, uma imaterial consistência pseudópode lança suas raízes no intestino e instala-se no ventre; expande-se no peito até o início da faringe e após ascender ao cérebro faz refém dos neurônios e assalta a mente envolvendo-a numas mil paranoias.

sábado, 15 de outubro de 2016

Depuração

As histórias fictícias de amor transmitidas pela literatura e novelas televisivas estão menos para inspiração mítica de amor supremo e sim para depuração do excesso de sentimentalismo presente na fértil imaginação do próprio escritor.


O autor do texto romântico compõe menos para inspirar jovens corações a buscarem seu amor ideal, e sim para esvaziar em palavras líricas a seiva bruta do sentimentalismo que transborda sua alma. Ele escreve para se livrar dos grilhões da idealização que, do alto da torre de todos os sonhos, lhe escravizam o sentimento. "Escrever é esquecer".

Mas, sem racionalizar que a literatura cria a realidade, o leitor-público, instado por uma realidade mais baixa que a do escritor, inspira-se no universo imaculado criado pela linguagem e, sem perceber, é hipnotizado por ilusões irreais.

O que de fato existe é a atração carnal de corpos humanos - olhares brilhantes, lábios sedutores, perfumes florais, calor e companhia humanos, mãos exploradoras e sorrisos magnéticos - o mais são amores supostos.

Nadar num oceano de amor

Uma flor de lótus a seus pés

Ame a si mesmo e depois comece a amar a Deus. Comece a amar a Krishna. 

Krishna significa o todo atraente. Deus é infinitamente atraente, ele é infinitamente amável.

Então se você começa a amar a si próprio, e depois você começa gradualmente a amar o infinitamente amável, você já está muito bem: você começa a nadar num oceano de amor. Aí você não vai precisar de buscar amor para você, porque você vai entender que o importante é amar. O que a alma quer fazer é amar. 

Então ao amar a si próprio e amar a Deus você vai estar recebendo ondas e ondas de amor. Então você não vai precisar pedir dos outros porque com tanto amor que você já está tendo, você vai poder direcionar o seu amor aos outros. Então você vai estar sendo uma fonte de amor.

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Glossário de expressões retiradas de "O amor nos tempos do cólera"

guerra sem glória;

branco de alabastro
dignidade da sua angústia;

duro de dor;

apreciou sua dor;

nua em pêlo/carne viva;

cão batido, carente de amor, de quem não se pode esperar nada;

tanta fluidez que pareciam flutuar acima dos escolhos da realidade;

foi providencial;

juntos tanto tempo e conversado tanto que se sentiam amigos antigos;

cheiro próprio de animal montês que a permitia distinguir entre todas as mulheres do mundo;

"Tomava café puro a qualquer hora, em qualquer lugar e em qualquer circunstância, e até trinta xricrinhas por dia: uma infusão que mais parecia petróleo cru, que preferia preparar ele mesmo e que sempre tinha numa garrafa térmica ao alcance da mão."

continuou encadeando um tema ao outro sem sequer se preocupar em ser escutado;

"- vai ver é por isso que faz tantas coisas - disse: - para não ter o que pensar;

agora e sempre;

semblante lúgubre;

persistido nos assédios;

infinita capacidade de ilusão;

não sabia de ciência alta onde acabava a realidade e começava o sonho;

fortaleza de suas raízes morais;

namorar é prometer o futuro
e eu não suportaria
quebrar uma promessa. 
 
soube nesse momento que também para ela soara a hora de se perguntar com dignidade, com grandeza, com desejos incontidos de viver, o que devia fazer com o amor sem dono que lhe havia ficado;

guardar o sabor do sonho;

romantismo crônico;

letargo irreal em que era mais fácil andar sem perguntas;

saltado o árduo calvário da vida conjugal e tivessem ido sem rodeios ao grão do amor;

"Nós homens somos uns pobres criados dos preconceitos", ele tinha dito certa vez. "Em compensação, quando uma mulher resolve dormir com um homem não há barreira que não salte, nem fortaleza que não derrube, nem consideração moral nenhuma que não esteja disposta a varar de lado a lado: não há Deus que valha."

mentiras líricas;

águas passadas não movem moinho;

"Tinha que ensiná-la a pensar no amor como um estado de graça que não era meio para nada, e sim origem e fim em si mesmo."

para aprender uma palavra nova não adianta querer decorar, e sim se lembrar dela pois a percebe recorrentemente.

" - Por que é que você insiste em falar no que não existe?"

sem pudor;

"não comer" :: "evitar comer";

"- Lembre-se que sempre o mais importante num bom casamento não é a felicidade e sim a estabilidade."

vontade lírica;

tropeço;

vigor mental =! sobressalto súbito de tristeza ou alegria;

"Acordara da sesta com trovões de artilharia que faziam tremer a terra, com a discórdia das bandas militares, a desordem dos cânticos fúnebres por cima do clamor dos sinos de todas as igrejas, que dobravam sem pausas desde o dia anterior."

"- Deixe que o tempo passe e já veremos o que traz."

As emoções como guia: o processo psicológico de desenvolvimento da pessoa através da vocação

Na psicologia o conceito de pessoa diferencia-se de indivíduo. Toda pessoa é um indivíduo, mas indivíduos não são necessariamente pessoas. É através do processo de individuação que a pessoa é desenvolvida, superando a personagem, que é constituída pelo aglomerado de máscaras advindas das posições sociais, das profissão, da família, etc. Máscaras de personagens  garantem segurança à pessoa à medida que conferem a certeza de que somos o papel que desempenhamos. Através de um processo de depuração a personagem vai sendo trabalhada para que se chegue à pessoa.

Individuação corresponde à auto-reaização, que é o estágio em que o indivíduo recolhe sua singularidade mais íntima, isto é, "chega a si mesmo".

Como foi mostrado alhures, o processo psicológico de individuação guarda analogias com o processo alquímico de composição da pedra filosofal, e a manipulação alquímica conhecida como conjunctio, que é a união do produto de Albedo com o produto de Citrinitas, é associada à operação psicológica de reconciliação da mente consciente à mente inconsciente, união esta que configura a consciência si-mesmo.

Na mente inconsciente habitam conteúdos sub-liminares que afloram ao consciente e que devem ser analisados criticamente para que não haja estagnação de energia psíquica.

À luz da psicologia, o padecimento humano consiste no constante ocultamento de correntes psicológicas oriundas do inconsciente, que não encontram abertura à experiência devido a barreiras impostas pelo eu-soberano.A penúria psicológica do ser humano é seu desconhecimento de si próprio, envolto nas sombras de uma cegueira ontológica.

O ser humano é como uma praça em estádio de sítio, em que no centro o eu-soberano constrói muralhas que selecionam apenas aquelas características as quais aceita como representativas de si mesmo. A atenção é dotada de conceitos e juízos super fundamentados na psique, dentre eles o espaço-tempo. A atenção seleciona e encaminha ao eu-soberano as disposições de personalidade que está disposta a aceitar: as máscaras e personalidades que se requisitam e se encenam.

A eterna tristeza psicológica dos animais humanos é a permanente agonia de existir através de máscaras que se requisitam a incrementarem uma personalidade fajuta - e o pior: agem assim sem saber que estão a encenar máscaras que algo ocultam.

A solução psicológica a este padecer do instinto é que o indivíduo se abra à experiência, que será sintetizada em terapia. A plenitude é alcançada quando o indivíduo segue a realidade processual de desenvolver suas aptidões, num processo que é chamado de caminho vocacional, em que são desenvolvidas suas aptidões naturais. Tal satisfação habilita a se falar de destino, uma vez que o sujeito sente intimamente que seu caminho vocacional é único e lhe confere uma vivência que está dirigida a ele apenas. Emerge na consciência a sensação de unidade e autenticidade, que são verificadas na vivência da vocação, que reorganiza a vida e compromissos profissionais.